Servidor efetivo pode receber gratificação em percentual sobre seus vencimentos
- 6 de janeiro de 2021
- Postado por: Inove
- Categoria: Notícias

É possível a criação de gratificações para compensar servidores efetivos pelo desempenho de atividades em regime de dedicação em tempo integral e pelo exercício de chefia de grupos de trabalho, na forma de percentual sobre os vencimentos do servidor. Porém, é necessário que lei em sentido formal estabeleça critérios objetivos para a definição do percentual a ser concedido a cada servidor ou empregado público. Além disso, é vedado o pagamento dessas gratificações a ocupantes de cargos em comissão.
A lei que criar cargo em comissão deverá necessariamente estabelecer os requisitos para posse relativos à escolaridade mínima, que deve compatível com as atribuições do cargo; ou à experiência profissional comprovada na área de atuação, a qual deve ser verificada mediante critérios definidos objetivamente em lei. Em relação à experiência, é vedada a adoção de critérios subjetivos, como “notório saber”, “ampla experiência”.
Essa é a orientação do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada pelo presidente da Câmara Municipal de Prado Ferreira, Claudionor Gonçalves Carrasco, por meio da qual questionou se seria possível a criação de gratificações para compensar servidores efetivos pelo desempenho de atividades em regime de dedicação em tempo integral e pelo exercício de chefia de grupos de trabalho. Ele também indagou sobre a possibilidade da criação de cargos comissionados sem requisitos mínimos de escolaridade.
Instrução do processo
Em seu parecer, a assessoria jurídica da câmara afirmou que projeto de lei deve prever critérios objetivos para fixar a variação de percentuais que podem ser pagos por gratificações; e ressaltou que é imprescindível o preenchimento de requisitos mínimos de escolaridade estabelecidos em lei para a posse de servidor efetivo ou para o exercício de cargo em comissão.
A Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR concluiu que é possível a instituição das gratificações questionadas. Mas destacou que os percentuais a serem pagos devem ser fixados em ato normativo anterior à sua concessão, com critérios objetivos; e, portanto, não pode haver o arbitramento do percentual pelo atual gestor.
A unidade técnica salientou que os cargos em comissão são exclusivos para as funções de direção, chefia e assessoramento, nos termos da Constituição Federal e do Prejulgado n° 25 do TCE-PR; e que a ausência de exigência de escolaridade mínima ou conhecimento específico do servidor afronta o princípio da eficiência administrativa.
O Ministério Público de Contas (MPC-PR) concordou com a CGM e opinou para que a consulta fosse respondida de acordo com os termos da instrução técnica.
Legislação e jurisprudência
O inciso II do artigo 37 da Constituição Federal (CF/88) dispõe que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.
O inciso V desse mesmo artigo estabelece que as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.
O inciso X do artigo 37 da CF/88 fixa que a remuneração dos servidores públicos e o subsídio dos agentes públicos somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso.
O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3369, fixou o entendimento de que “em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei específica”; e ao julgar a ADI 2075, entendeu que “o tema concernente à disciplina jurídica da remuneração funcional submete-se ao postulado constitucional da reserva absoluta de lei, vedando-se, em consequência, a intervenção de outros atos estatais revestidos de menor positividade jurídica”.
O Prejulgado n° 25 (Acórdão n° 3595/17 – Tribunal Pleno) define parâmetros objetivos para se considerar regular o provimento de cargos em comissão e funções de confiança na administração pública estadual e municipal.
O item “I” do prejulgado fixa que a criação de cargos de provimento em comissão e funções de confiança demanda a edição de lei em sentido formal que deverá, necessariamente, observar os princípios da razoabilidade, proporcionalidade e eficiência, prevendo a denominação, o quantitativo de vagas e a remuneração, podendo ser objeto de ato normativo regulamentar a definição das atribuições e eventuais requisitos de investidura, observada a competência de iniciativa em cada caso.
O item “II” dispõe que o Poder Legislativo, a depender da disciplina vigente sobre o respectivo processo legislativo, poderá dispor sobre o tema por meio de resolução, exceto quanto à definição da remuneração do cargo ou função, que carece de lei em sentido formal em qualquer hipótese.
O item “III” do Prejulgado nº 25 expressa que direção e chefia pressupõem competências decisórias e o exercício do poder hierárquico em relação a outros servidores, nos termos previstos em ato normativo; os cargos de direção estão relacionados ao nível estratégico da organização, enquanto os cargos de chefia atuam no nível tático e operacional.
O item “IV” do prejulgado destaca que a função de assessoramento diz respeito ao exercício de atribuições de auxílio, quando, para o seu desempenho, for exigida relação de confiança pessoal com o servidor nomeado, hipótese em que deverá ser observada a compatibilidade da formação ou experiência profissional com as atividades a serem desenvolvidas.
O item “V” salienta que é vedada a criação de cargos em comissão para o exercício de atribuições técnicas-operacionais ou burocráticas, exceto quando o exercício dessa atividade exigir vínculo de confiança pessoal com o servidor nomeado.
Decisão
O relator do processo, auditor Tiago Alvarez Pedroso, afirmou que não há qualquer vedação para a criação de gratificações de regime de dedicação em tempo integral e pelo exercício de chefia de grupos de trabalho. Mas ressaltou que a fixação do percentual sobre os vencimentos que será utilizado para calcular o valor da gratificação não pode ser estipulado por ato infralegal.
Ele lembrou que o inciso X do artigo 37 da CF/88 estabelece que a remuneração dos servidores públicos somente poderá ser fixada ou alterada por lei específica e que o STF já ratificara esse entendimento em suas decisões. Assim, ele concluiu que as gratificações, que também fazem parte da remuneração, devem igualmente ser fixadas em lei.
Pedroso destacou que o item “II” do Prejulgado nº 25 do TCE-PR dispõe que a definição da remuneração do cargo ou função carece de lei em sentido formal em qualquer hipótese. E acrescentou que o estabelecimento de critérios para definição do valor de gratificação por meio de ato normativo infralegal possibilitaria que os valores fossem alterados indiscriminadamente pela autoridade responsável pela concessão do benefício.
Portanto, o auditor salientou que a lei que cria a gratificação não pode permitir que os critérios para a definição do seu valor possam ser fixados por ato infralegal, justamente para não haver ofensa os princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade, além de afronta à disposição literal da Constituição Federal – artigo 37, X.
O relator também frisou que o estabelecimento de requisitos mínimos de escolaridade ou experiência para a posse em cargo comissionado é uma decorrência lógica dos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade. Ele concluiu que aquele que não dispõe de experiência, conhecimento técnico ou educação formal, presumidamente, não tem condições de dirigir, chefiar ou assessorar.
Finalmente, o auditor afirmou que não há impedimento para que se reconheça também a possibilidade de se estabelecer como requisito para posse em cargo em comissão a experiência profissional, desde que devidamente comprovada mediante o cumprimento de requisitos objetivos.
Os conselheiros aprovaram o voto do relator por unanimidade, na sessão virtual nº 14 do Tribunal Pleno, concluída em 26 de novembro. O Acórdão nº 3606/20 – Tribunal Pleno foi disponibilizado em 7 de dezembro passado, na edição nº 2.438 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC). A decisão transitou em julgado em 16 de dezembro.