Já está na hora de alterar a ‘Nova Lei de Licitações’?: Quais são os projetos que objetivam modificar o texto da Lei nº 14.133/2021?
- 8 de abril de 2022
- Posted by: Inove
- Category: Conteúdos
Em breve, teremos completado um ano de vigência da Lei nº 14.133/2021, a chamada “Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos”.
Por se tratar de uma norma primária de extrema repercussão, sensibilidade e interesses contrapostos é até natural e esperado que tenham surgido proposições legislativas para a sua alteração. Na verdade, mesmo diante do regime transitório previsto em seu art. 191, o aprofundamento dos estudos e as iniciativas de alguns órgãos públicos e entes federativos de aplicação efetiva e regulamentação da NLL vem culminando na identificação de problemas, contradições, lacunas e eventuais inconsistências do texto legal.
Precisamos compreender que o processo legislativo é, em sua essência, dinâmico e interminável. A lógica política de diálogo e absorção de interesses dos mais diversos setores da sociedade, da economia e da própria tecnoburocracia estatal qualifica a multiplicidade de focos de fomento das iniciativas legislativas, seja para disciplinar novos temas, seja para modificar a disciplina de temas já normatizados.
Particularmente creio ser rasa e apressada a afirmação de que não seria positiva a alteração de uma norma – como a Lei nº 14.133/2021 – apenas em razão do transcurso de “tão pouco tempo desde a sua edição”. Ora, normas precisam ser aperfeiçoadas sempre que identificada a necessidade de ajuste, correção, evolução textual… A própria Constituição Cidadã de 1988, como forma de viabilizar seu aprimoramento após um período de efetiva “experimentação”, previu no art. 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), a realização de um processo de “revisão constitucional” que culminou na edição de seis “emendas constitucionais de revisão”.
A própria Lei nº 8.666, de 21/06/1993, menos de um ano após a sua edição, passou por uma considerável “revisão” por meio da Medida Provisória nº 472, de 15/04/1994, convertida na Lei nº 8.883, de 08/06/1994. Situação similar se passou com o Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), publicado em 16/03/2016. Antes mesmo de entrar em vigor [1], passou por ajustes em diversos dispositivos por meio da Lei nº 13.256, de 04/02/2016.
No caso específico da Lei nº 14.133/2021, considerando justamente seu regime transitório sui generis que permite a “opção” por sua não aplicação até 31/03/2023, me parece que a “correção de rumos” já em seus primórdios seja salutar justamente para conferir a tão almejada segurança jurídica, porquanto a norma necessita de ajustes sistêmicos para superação de inconsistências – e até mesmo contradições – intestinas e, ainda, para afastar sentidos incompatíveis com a Constituição, notadamente em pontos nos quais há um claro predomínio de uma visão tecnocrata federal.
Não nos esqueçamos que a apreciação do PL nº 4.253/2020, em dezembro de 2020, se deu em um contexto sem precedentes no Senado Federal: Plenário em sistema remoto de votação decorrente da pandemia do coronavírus e ausência de atuação das comissões que, em tese, apreciariam com maior vagar e profundidade o substitutivo então aprovado na Câmara dos Deputados [2]. Ou seja, por questões circunstanciais de força maior, foram decisivamente afetados os debates, as discussões e as reflexões sobre o texto oriundo da Câmara (que alterou profundamente o texto inicial do Senado). Por óbvio, tal situação repercutiu sobremaneira na coerência sistêmica de um texto legislativo de 194 artigos…
Enfim, após essas breves considerações que não têm a pretensão de esgotar o assunto e de impor uma “visão de mundo” correta sobre um fenômeno tão complexo e multifacetário como a produção legislativa em um contexto de vertiginosa metamorfose das estruturas do presidencialismo de coalização no Brasil e de fragilização do Poder Legislativo e do próprio sentido da democracia representativa, buscarei consolidar a seguir os projetos de lei até então protocolados no Congresso Nacional que tenham por objetivo empreender alguma alteração no texto da Lei nº 14.133/2021.
Projetos de Lei em tramitação na Câmara dos Deputados
Nº DO PROJETO [3] | INICIATIVA | ASSUNTO | SITUAÇÃO ATUAL |
Substitutivo da CTASP PL nº 3824/2019 | Deputado Leonardo Monteiro (relator do PL na CTASP) | Altera as Leis nº Lei 8.666 de 21 de novembro de 1993 e Lei nº 14.133, de 01º de abril de 2021, para autorizar os Municípios que publiquem os avisos contendo os resumos dos editais das concorrências, das tomadas de preços, dos concursos e dos leilões, em seu Diário Oficial Eletrônico. | Aprovado o substitutivo na CTASP. Em 10/12/2021, o projeto foi enviado para apreciação da CFT. |
PL nº 1883/2020 | Deputado Ricardo Silva | Dispõe sobre a licitação sustentável para a aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional permitindo a adoção de critérios ambientalmente corretos, socialmente justos e economicamente viáveis e dá outras providências. | Aguardando Parecer do Relator na CMADS |
PL nº 2633/2020 | Deputado Zé Silva | Altera a Lei n° 11.952, de 25 de junho de 2009, que dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União; a Lei n° 8.666, de 21 de junho de 1993, que institui normas para licitações e contratos da administração pública; a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que dispõe sobre os registros públicos; a fim de ampliar o alcance da regularização fundiária e dar outras providências. | Aprovado pelo Plenário da CD em 03/08/2021 e remetido para apreciação do SF em 04/08/2021. |
PL nº 1454/2021 | Deputado Leonardo Gadelha | Altera a Lei nº 14.133, de 2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos), para reservar, pelo menos, 5% (cinco por cento) dos postos de trabalho nos contratos de serviços de execução por terceiros, para mulheres vítimas de violência doméstica, dependentes economicamente de seus cônjuges ou companheiros. | Apensado ao PL 9384/2017 |
PL nº 1901/2021 | Deputado Dr. Jaziel | Acrescenta § 8º ao art. 115 e inciso XIII ao art. 155, ambos da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para estabelecer a obrigação que especifica, e dá outras providências. | Aguardando Parecer do Relator na CFT |
PL nº 2227/2021 | Deputado Enrico Misasi | Altera a Lei n° 14.133, de 1º de abril de 2021, para acrescentar a possibilidade de os editais de licitação exigirem que percentual mínimo da mão de obra responsável pela execução do objeto da contratação seja preenchido por pessoas atendidas por órgãos integrantes do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e dos Sistemas de Políticas Públicas sobre Drogas dos Estados, Distrito Federal e Municípios | Aguardando Parecer do Relator CSPCCO |
PL nº 2689/2021 | Deputado Delegado Waldir | Altera a Lei n° 14.133, de 1º de abril de 2021, para prever a obrigatoriedade de implantação de programa de integridade pelos órgãos e entidades públicos. | Em análise pela CTASP e CCJ, sujeita à apreciação conclusiva |
PL nº 3260/2021 | Deputado Fausto Pinato | Altera as Leis nos 8.666, de 21 de junho de 1993, e 14.133, de 1º de abril de 2021, para fixar diretrizes de sustentabilidade, a serem observadas nas contratações públicas. | Apensado ao PL 1883/2020 |
PL nº 3883/2021 | Deputado Fábio Henrique | Altera a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para obrigar os órgãos e entidades da Administração Pública a disponibilizarem Código de Barra Bidimensional QR – QR em cada placa de inauguração de obra pública com o objetivo de fornecer informações completas sobre o histórico de execução da obra. | Apensado ao PL 1901/2021 |
PL nº 4245/2021 | Deputado Milton Coelho e outros | Altera a Lei 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos) para dispor sobre a publicização, de maneira simplificada, discriminada e compreensível à população, através de placas e outdoors nos sítios em que se executem as atividades de engenharia e arquitetura, todos os recursos financeiros utilizados pela Administração Pública na execução de obras públicas. | Apensado ao PL 1901/2021 |
PL nº 4531/2021 | Deputados Felipe Rigoni e Tabata Amaral | Altera a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 e a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, para reduzir o valor mínimo de contratação a partir do qual é obrigatória a implantação de programa de integridade pelo contratado, e dá outras providências. | Aguardo despacho do Presidente da CD para definição da tramitação |
Projetos de Lei em tramitação no Senado Federal
Nº DO PROJETO | INICIATIVA | ASSUNTO | SITUAÇÃO ATUAL |
PLS nº 2340/2021 | Senador Rogério Carvalho | Altera o Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), para conceituar dolo e erro grosseiro, e a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para incluir garantias ao gestor ou agente público que atue no processo de contratação direta ou mediante licitação. | Projeto apresentado, sem qualquer andamento no SF |
PLS nº 2607/2021 | Senadora Zenaide Maia | Acrescenta inciso VII ao art. 68 da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, que regula as licitações e contratos administrativos, para estabelecer como requisito para habilitação a verificação do cumprimento das quotas de aprendizagem e dá outras providências. | Projeto apresentado, sem qualquer andamento no SF |
PLS nº 2825/2021 | Senador Veneziano Vital do Rêgo | Altera a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016, e a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para estabelecer como critérios para desempate em licitações públicas o patrocínio a atletas ou equipes de esporte olímpico, bem como a construção, o auxílio na construção, a manutenção e o auxílio na manutenção de estrutura pública destinada à prática de esporte olímpico. | Aprovado pelo Plenário do SF em 09/11/2021 e remetido para a CD em 12/11/2021. |
PLS nº 3092/2021 | Senador Rogério Carvalho | Altera a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, dispondo sobre vedação de fiança fidejussória na prestação de garantias. | Projeto apresentado, sem qualquer andamento no SF |
PLS nº 3828/2021 | CPI da Pandemia | Altera a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, e a Lei nº 8.142 de 28 de dezembro de 1990, para estabelecer mecanismos de registro, controle e eficiência na aplicação de transferências federais, especialmente no âmbito da saúde. | Na CCJ aguardando designação de relator |
PLS nº 4277/2021 | Senador Rogério Carvalho | Altera a Lei nº 8.666, de 21 de julho de 1993, a Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016, e a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para dispor sobre a contratação de estudantes universitários e estudantes de cursos profissionalizantes como cláusula obrigatória dos contratos administrativos. | Projeto apresentado, sem qualquer andamento no SF |
PL nº 4334/2021 | Senador Randolfe Rodrigues | Altera a Lei nº 14.133, de 1º de agosto de 2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos), para estabelecer a obrigatoriedade de os órgãos e entidades da Administração Pública elaborarem e implementarem Programa de Integridade, com o objetivo de promover a adoção de medidas e ações institucionais destinadas à prevenção, à detecção, à punição e à remediação de fraudes e atos de corrupção nas contratações públicas. | Projeto apresentado, sem qualquer andamento no SF |
PLS nº 4506/2021 | Senador Alessandro Vieira | Altera a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 e a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, para reduzir o valor mínimo de contratação a partir do qual é obrigatória a implantação de programa de integridade pelo contratado, e dá outras providências. | Projeto apresentado, sem qualquer andamento no SF |
Por fim, nunca é demais lembrar: tratam-se apenas de iniciativas legislativas pontuais e que precisam passar por um longo e complexo processo legislativo bicameral. E mais: além de ser um ano de eleições federais e estaduais, 2022 contempla a última sessão legislativa da 56ª Legislatura, que tem importantes repercussões regimentais tanto na Câmara dos Deputados (art. 105 do RICD) quanto no Senado Federal (art. 332 do RISF).
Victor Amorim é doutorando em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Mestre em Direito Constitucional (IDP). Membro do Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações Públicas. Assessor Técnico da Diretoria-Geral do Senado Federal. Professor de pós-graduação do ILB, IDP e IGD. Coordenador do curso de pós-graduação em Licitações e Contratos Administrativos do IGD. Por mais de 13 anos, atuou como Pregoeiro no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (2007-2010) e no Senado Federal (2013-2020). Foi Assessor Técnico da Comissão Especial de Modernização da Lei de Licitações, constituída pelo Ato do Presidente do Senado Federal nº 19/2013, responsável pela elaboração do PLS nº 559/2013 (2013-2016). Membro da Comissão Permanente de Minutas-Padrão de Editais de Licitação do Senado Federal (desde 2015). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo (IBDA). Advogado e Consultor Jurídico.
[1] O art. 1.045 do CPC estabeleceu que a lei entraria em vigor após decorrido um ano de sua publicação, que se deu no DOU de 17/03/2015.
[2] Para maior aprofundamento, vide tramitação do PL nº 4.253/2020: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/145636>. Note-se que o despacho do Presidente do SF “recebendo” o substitutivo advindo da CD data de 02/12/2020. Após 5 dias úteis, já em 10/12/2020, por meio do sistema remoto de votação, o Plenário do SF deliberou sobre o projeto, aprovando-o com alguns destaques.
[3] Cumpre esclarecer que foram relacionados projetos de lei com origem anterior à data de publicação da Lei nº 14.133/2021 pelo fato de, posteriormente à edição da norma, emendas vieram a ampliar o escopo do projeto, passando a contemplar proposições de alteração da NLL.
*Artigo gentilmente cedido pelo autor e publicado originalmente no Observatório da Nova Lei de Licitações no dia 6 de abril de 2022, disponível em https://www.novaleilicitacao.com.br/2022/01/25/ja-esta-na-hora-de-alterar-a-nova-lei-de-licitacoes-quais-sao-os-projetos-que-objetivam-modificar-o-texto-da-lei-no-14-133-2021/