Aspectos de discricionariedade do gestor público nos casos de dispensa de licitação na Lei nº 14.133/2021
- 26 de janeiro de 2024
- Posted by: Inove
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RESUMO
A pesquisa em evidência esclarece o novo cenário a partir da edição da Lei nº 14.133/2023 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos), que revogou expressamente as leis anteriores que tratavam sobre a matéria. Assim, o contexto contemporâneo merece um estudo minucioso, já que houve mudança substancial em relação aos critérios licitatórios e nas possibilidades de contratação direta. O presente estudo identifica as principais alterações trazidas pela referida lei, especialmente no que diz respeito à dispensa de licitação e à discricionariedade do gestor público na sua aplicação. O referencial teórico proporcionará os esclarecimentos necessários para a base teórica da pesquisa. Metodologicamente, o presente estudo classifica-se como aplicada, de abordagem qualitativa. A pesquisa documental será o suporte, já que a análise será executada a partir da legislação vigente sobre a matéria, além de regulamentos e instruções normativas. Por fim, diante da interpretação e da análise aprofundada, serão elencadas as opções disponíveis ao gestor público diante de sua discricionariedade na tomada de decisão da dispensa de licitação.
PALAVRAS-CHAVE:
Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Licitação. Administração Pública. Dispensa de Licitação. Gestor Público.
1. INTRODUÇÃO
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 37, inciso XXI, estabelece que os contratos administrativos devem ser precedidos de licitação pública. Além disso, extrai-se do artigo 175 da Lei Fundamental que também é necessário o procedimento licitatório em relação às outorgas de concessões e permissões.
Denota-se, portanto, que a licitação possui expressa previsão constitucional e é exigida para a maioria das contratações públicas, especialmente a fim de cumprir com os princípios básicos impostos à Administração Pública pela Carga Magna em seu artigo 37, caput, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Segundo Justen Filho (2011):
A licitação é um procedimento administrativo disciplinado por lei e por um ato administrativo prévio, que determina critérios objetivos seleção de proposta da contratação mais vantajosa, com observância do princípio da isonomia, conduzido por um órgão dotado de competência específica.
O procedimento licitatório é um mecanismo constitucionalmente previsto para a realização das contratações públicas, de modo que a exceção à realização da licitação exige o enquadramento da situação a uma das hipóteses previstas na Lei nº 14.133/2021.
Conforme adiantado nas considerações introdutórias, a Lei nº 14.133/2021 trouxe necessárias modificações para o âmbito das contratações públicas, desde os princípios aplicáveis às licitações até as possibilidades de contratação direta.
Nesta seara, evidencia-se que a nova legislação trouxe para o ordenamento jurídico um extenso rol de princípios a serem seguidos no procedimento licitatório, embora alguns deles já possuíssem previsão constitucional.
Diante do cenário político brasileiro, especialmente os recorrentes casos de corrupção, a análise aprofundada das possibilidades de contratação direta se mostra de suma importância. Isso porque, aproveitando-se do poder discricionário, agentes públicos podem, ao arrepio das normas constitucional e infraconstitucional que tratam da matéria, beneficiar algumas empresas em detrimento de outras, ocasionando não apenas prejuízo financeiro ao ente público, mas grave ruptura da probidade administrativa.
Dessa forma, o estudo do atual procedimento de licitatório torna-se relevante para que se possa, na prática, evitar que brechas sejam criadas a fim burlar o processo legalmente previsto. Do mesmo modo, a análise das hipóteses de contratação direta e da discricionariedade do gestor público permite a blindagem do poder público, já que se trata de rol taxativo e que deve ser interpretado restritivamente.
Partindo do exposto, o presente artigo objetiva avaliar a atual conjuntura do procedimento, a partir da análise dos diferenciais entre as Leis nº 14.133/2021e nº 8.666/1993, os aspectos discricionários para a tomada de decisão do gestor público no que se refere à dispensa de licitação.
i) Apresentar esclarecimentos e ponderações sobre a dispensa de licitação no contexto da Lei nº 14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos).
ii) Apresentar aos gestores públicos as opções de decisões no contexto da dispensa de licitação.
iii) Elencar o rol de possibilidades de escolha que o agente público passou a ter com o advento da Lei nº 14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos) em relação à dispensa de licitação.
Com o resultado prático, ponderando acerca das novas modalidades e critérios de licitação, assim como examinando as situações em que é permitida ao ente público a contratação direta, com ênfase na discricionariedade do agente público na tomada de decisão da dispensa de licitação. Trata-se de uma pesquisa qualitativa e sob o ponto de vista dos seus objetivos é exploratória e descritiva, utilizou-se da pesquisa bibliográfica e documental.
2. REFERENCIAL TEÓRICO E DOCUMENTAL
O processo licitatório é feito de forma a atender às administrações públicas federal, estadual, distrital e municipal, abrangendo as administrações dos Poderes Legislativo, Executivo, Judiciário, Tribunais de Contas e do Ministério Público. A fim de combater as práticas de corrupção, nepotismo e favorecimentos baseados em interesses pessoais, em geral, este processo prima pelos princípios da legalidade, impessoalidade, igualdade, moralidade, probidade administrativa, publicidade, sigilo das propostas, vinculação ao ato convocatório, julgamento objetivo, competitividade e eficiência (economicidade, vantajosidade e formalismo moderado).
Mello (2009) apresenta como definição básica para licitação:
Procedimento administrativo pelo qual uma pessoa governamental, pretendendo alienar, adquirir ou locar bens, realizar obras ou serviços, outorgar concessões, permissões de obra, serviço ou de uso exclusivo de bem público, segundo condições por ela estipuladas previamente, convoca interessados na apresentação de propostas, a fim de selecionar a que se revele mais conveniente em função de parâmetros antecipadamente estabelecidos e divulgados.
De acordo com o que se extrai da Lei nº 14.133/2021, especificamente em seu artigo 72, a contratação direta é uma exceção, de modo que a regra é licitar.
Neste contexto, o artigo 74 da LLCA, dispõe, em rol taxativo, sobre as hipóteses inexigibilidade de licitação, isto é, os casos em que a Administração Pública, diante da inviabilidade de competição, pode contratar diretamente, sem a realização do procedimento licitatório.
O artigo 75 do diploma legal em comento, por sua vez, traz o instituto da dispensa de licitação, o qual, diferentemente da inexigibilidade de licitação, elenca as circunstâncias taxativas em que a licitação é desnecessária para a Administração Pública.
Em ambos os casos (inexigibilidade de licitação e dispensa de licitação), deve haver um processo administrativo para a contratação, embora não se enquadrem nas modalidades licitatórias, são procedimentos que devem ser precedidos de processo administrativo.
A legislação traz algumas faculdades aos gestores públicos na forma de executar tal processo, como a possibilidade ou não de usar alguns documentos e de solicitar ou não parecer jurídico. Todavia, algumas regras são necessárias e devem ser cumpridas, como a pesquisa de preço, a autorização da autoridade competente, a demonstração da compatibilidade da previsão de recursos orçamentários, o compromisso a ser assíduo, a justificativa da escolha do contrato, etc.
Conforme adiantado, a inexigibilidade de licitação está prevista no artigo 74, podendo ser utilizada quando não existe competição, ou seja, quando a disputa for impossível. Para Carvalho (2023): “Ao definir o que seria inviabilidade de competição justificadora de contratação direta pela Administração Pública, a doutrina majoritária costuma apontar pressupostos da licitação e estabelece que a ausência de qualquer dos pressupostos torna o procedimento licitatório inexigível”.
De outro lado, a dispensa de licitação é uma ferramenta que pode ser usada pela Administração Pública em casos específicos, mesmo quando seja possível a competição e quando exista uma modalidade de licitação que se encaixe na situação. Neste caso, o legislador traz a discricionariedade para a autoridade competente optar pela realização do procedimento de dispensa, o qual, repita-se, deve ser precedido de um processo administrativo.
O rol do artigo 75 é taxativo, não sendo possível a criação de outras situações de enquadramento. Para melhor compreensão, a análise dos incisos será realizada de forma individualizada.
Os dois primeiros incisos do artigo 75 expressam o seguinte:
I – para contratação que envolva valores inferiores a R$ 100.000,00 (cem mil reais), no caso de obras e serviços de engenharia ou de serviços de manutenção de veículos automotores;
II – para contratação que envolva valores inferiores a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), no caso de outros serviços e compras.
Nessas hipóteses de dispensa de licitação, deve ser levado em conta o valor da contratação de acordo com o limite dos dois incisos, além da análise do objeto a ser contrato. Esses limites têm regras específicas para serem utilizados, o que será aprofundado mais adiante. Além disso, esclarece-se que os valores dos incisos serão atualizados todo início de ano por meio de Decreto Presidencial, de modo que tais valores serão usados para o ano inteiro, sofrendo correção monetária conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), aplicado pelo Governo Federal.
Na sequência, tem-se o terceiro inciso do artigo 75, que não tem limite de valor e pode ser empregado quando a licitação for deserta ou fracassada, quando não existirem interessados ou quando não houver propostas aceitas e/ou a habilitação de um vencedor.
III – para contratação que mantenha todas as condições definidas em edital de licitação realizada há menos de 1 (um) ano, quando se verificar que naquela licitação:
a) não surgiram licitantes interessados ou não foram apresentadas propostas válidas;
b) as propostas apresentadas consignaram preços manifestamente superiores aos praticados no mercado ou incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais competentes;
O quarto inciso do artigo 75, por sua vez, divide-se em treze alíneas, conforme se demonstra:
IV – para contratação que tenha por objeto:
a) bens, componentes ou peças de origem nacional ou estrangeira necessários à manutenção de equipamentos, a serem adquiridos do fornecedor original desses equipamentos durante o período de garantia técnica, quando essa condição de exclusividade for indispensável para a vigência da garantia;
b) bens, serviços, alienações ou obras, nos termos de acordo internacional específico aprovado pelo Congresso Nacional, quando as condições ofertadas forem manifestamente vantajosas para a Administração;
c) produtos para pesquisa e desenvolvimento, limitada a contratação, no caso de obras e serviços de engenharia, ao valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais);
d) transferência de tecnologia ou licenciamento de direito de uso ou de exploração de criação protegida, nas contratações realizadas por instituição científica, tecnológica e de inovação (ICT) pública ou por agência de fomento, desde que demonstrada vantagem para a Administração;
e) hortifrutigranjeiros, pães e outros gêneros perecíveis, no período necessário para a realização dos processos licitatórios correspondentes, hipótese em que a contratação será realizada diretamente com base no preço do dia;
f) bens ou serviços produzidos ou prestados no País que envolvam, cumulativamente, alta complexidade tecnológica e defesa nacional;
g) materiais de uso das Forças Armadas, com exceção de materiais de uso pessoal e administrativo, quando houver necessidade de manter a padronização requerida pela estrutura de apoio logístico dos meios navais, aéreos e terrestres, mediante autorização por ato do comandante da força militar;
h) bens e serviços para atendimento dos contingentes militares das forças singulares brasileiras empregadas em operações de paz no exterior, hipótese em que a contratação deverá ser justificada quanto ao preço e à escolha do fornecedor ou executante e ratificada pelo comandante da força militar;
i) abastecimento ou suprimento de efetivos militares em estada eventual de curta duração em portos, aeroportos ou localidades diferentes de suas sedes, por motivo de movimentação operacional ou de adestramento;
j) coleta, processamento e comercialização de resíduos sólidos urbanos recicláveis ou reutilizáveis, em áreas com sistema de coleta seletiva de lixo, realizados por associações ou cooperativas formadas exclusivamente de pessoas físicas de baixa renda reconhecidas pelo poder público como catadores de materiais recicláveis, com o uso de equipamentos compatíveis com as normas técnicas, ambientais e de saúde pública;
k) aquisição ou restauração de obras de arte e objetos históricos, de autenticidade certificada, desde que inerente às finalidades do órgão ou com elas compatível;
l) serviços especializados ou aquisição ou locação de equipamentos destinados ao rastreamento e à obtenção de provas previstas nos incisos II e V do caput do art. 3º da Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013, quando houver necessidade justificada de manutenção de sigilo sobre a investigação;
m) aquisição de medicamentos destinados exclusivamente ao tratamento de doenças raras definidas pelo Ministério da Saúde;
A alínea ‘a’ pode ser utilizada para que se mantenha a garantia do bem público dentro do período concedido pelo fabricante do bem, como um serviço de manutenção de um veículo novo, que deve ser feito na concessionaria. Já a alínea ‘b’, diz depende de uma legislação específica, tendo que ser observada a vantajosidade para a Administração Pública. A alínea ‘c’ se destina à contratação de materiais, bens ou serviços em âmbito de Pesquisas Cientificas e Tecnológicas, com o propósito de incentivar cada vez mais o desenvolvimento científico brasileiro, de modo que a regra da vantajosidade para o Poder Público também deve ser observada. A alínea ‘d’ refere-se à transferência, entre órgãos, de tecnologia ou de licenciamento de direito de uso ou de exploração de criação protegida. A alínea ‘e’ envolve a contratação em caráter de urgência em razão da prerrogativa da não descontinuidade do fornecimento de alimentos, podendo ser utilizada apenas enquanto o processo licitatório ainda não foi finalizado e tendo como exemplo a aquisição de hortifrutigranjeiros para a merenda escolar. A alínea ‘f’ se enquadra nas situações cumulativas de defesa nacional em que há demanda de alta complexidade tecnológica. A alínea ‘g’ se relaciona com as necessidades das forças armadas, para segurança e uniformização de matérias que poderiam comprometer a segurança, não podendo ser utilizada em favor do setor administrativo. A alínea ‘h’ dispõe acerca da segurança dos servidores que, a serviço de seu país, encontram-se fora do Brasil. A alínea ‘i’, por sua vez, destaca os casos em que servidores efetivos estão fora de sua sede durante curto período de tempo. A alínea ‘j’ se destina, por exemplo, às associações de catadores de lixo que fazem a coleta de resíduos recicláveis e reutilizáveis, oportunizando e facilitando a oportunidade de contratar com o Poder Pública em favor de uma fatia da sociedade que necessita de ajuda para a subsistência. A alínea ‘k’ se trata de hipótese que poderia ser enquadrado como inexigibilidade, conforme o artigo 74, inciso III, da Lei nº 14.133/2021. A alínea ‘l’ evidencia as situações que se relacionam com a Lei nº 12.850/2013 (Lei de Organização Criminosa), a qual regulamenta a investigação criminal, os meios de obtenção de provas, as infrações penais correlatas e o procedimento criminal para dissolução de organizações criminosas, citando-se como exemplo o serviço de instalação de câmeras de filmagem em locais estratégicos para uma investigação criminal. Por fim, a alínea ‘m’ se dirige à aquisição de medicamentos que não fazem parte da lista de medicamentos oferecidos a população, hipótese em que o Ministério da Saúde definirá o rol de doenças raras que necessitam desses remédios específicos.
Em seguida, denota-se que o inciso V do artigo 75, relaciona-se com contratação destinada a projetos que envolvam entidades privadas sem fins lucrativos voltadas à pesquisa e ao desenvolvimento, bem como que buscam a elaboração de novos produtos, processos e serviços inovadores. Cita-se, como exemplo, a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
V – para contratação com vistas ao cumprimento do disposto nos arts. 3º, 3º-A, 4º, 5º e 20 da Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004, observados os princípios gerais de contratação constantes da referida Lei.
Não se pode submeter a segurança nacional em ameaça por uma necessidade de licitar, por esse motivo, foi editado o inciso VI do artigo 75, conforme se vislumbra:
VI – para contratação que possa acarretar comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos pelo Ministro de Estado da Defesa, mediante demanda dos comandos das Forças Armadas ou dos demais ministérios;
O inciso VII, por sua vez, explana a situação em que o Estado não necessita do processo licitatório pelas seguintes razões excepcionais:
VII – nos casos de guerra, estado de defesa, estado de sítio, intervenção federal ou de grave perturbação da ordem;
No inciso VII, constam as hipóteses de situações atípicas e emergenciais que precisam ser corrigidas imediatamente, isto é, sem que se possar dispor do tempo necessário para um procedimento licitatório. Cita-se, como exemplo, o caso de um forte temporal que ocasiona o destelhamento da sede de um órgão federal, oportunidade em que a contratação, tanto do serviço como dos materiais, ocorrerá via dispensa de licitação. Outro exemplo seria o episódio em que um agente público, por esquecimento e falta de planejamento, não adquire a merenda escolar de determinada escola pública, de modo que o Estado, independente do erro cometido pelo seu agente, possui o dever de fornecer os alimentos aos alunos, sem prejuízo de procedimento disciplinar para a responsabilização do agente causador da situação emergencial.
VIII – nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a continuidade dos serviços públicos ou a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para aquisição dos bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 1 (um) ano, contado da data de ocorrência da emergência ou da calamidade, vedadas a prorrogação dos respectivos contratos e a recontratação de empresa já contratada com base no disposto neste inciso.
O inciso IX do artigo 75, retrata a ocorrência de uma parceria entre os entes do Poder Público. Veja-se:
IX – para a aquisição, por pessoa jurídica de direito público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidade que integrem a Administração Pública e que tenham sido criados para esse fim específico, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado;
Na situação em que se verificar a necessidade de interferência da União no domínio econômico, aplica-se o inciso X:
X – quando a União tiver que intervir no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento.
Diferentemente da licitação em que o ente federativo pode contratar um consórcio de empresas, no inciso XI, trata-se de consórcios de entes públicos, os quais se unem a fim de contratar outro consórcio, também criado entre outros entes públicos.
XI – para celebração de contrato de programa com ente federativo ou com entidade de sua Administração Pública indireta que envolva prestação de serviços públicos de forma associada nos termos autorizados em contrato de consórcio público ou em convênio de cooperação;
A burocracia de uma licitação não pode ser levada em conta para as contratações que envolvam materiais estratégicos para o Sistema Único de Saúde (SUS), razão pela qual o inciso XII dispõe:
XII – para contratação em que houver transferência de tecnologia de produtos estratégicos para o Sistema Único de Saúde (SUS), conforme elencados em ato da direção nacional do SUS, inclusive por ocasião da aquisição desses produtos durante as etapas de absorção tecnológica, e em valores compatíveis com aqueles definidos no instrumento firmado para a transferência de tecnologia.
O inciso XIII do artigo 75 prevê a possibilidade de contratação de um profissional para compor a equipe de análise técnica, como a contratação um especialista para compor a comissão que analisará a pontuação técnica em um processo de concorrência que será realizado pelo critério de julgamento de técnica e preço, de modo que, neste caso, o profissional será contratado pela sua expertise para execução pontual daquele serviço.
XIII – para contratação de profissionais para compor a comissão de avaliação de critérios de técnica, quando se tratar de profissional técnico de notória especialização.
Ainda, o inciso XIV do artigo 75 se direciona à contratação com instituição sem fins lucrativos que tenha por objetivo minimizar os problemas sociais brasileiros e que ofereça um preço compatível com o valor de mercado. Diante disso, deve ser realizada uma pesquisa de preço, e, se tal valor for compatível com as exigências legais, passa-se à fase de contratação desta instituição ou associação.
XIV – para contratação de associação de pessoas com deficiência, sem fins lucrativos e de comprovada idoneidade, por órgão ou entidade da Administração Pública, para a prestação de serviços, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado e os serviços contratados sejam prestados exclusivamente por pessoas com deficiência;
O inciso XV do artigo 75 evidencia os casos em que há a necessidade de se contratar uma instituição de apoio com o objetivo gerenciar uma atividade de pesquisa e extensão, como a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), que pode contratar a Fundação de Apoio à UTFPR (FUNTEF) para gerenciar os custos de projetos da Universidade.
XV – para contratação de instituição brasileira que tenha por finalidade estatutária apoiar, captar e executar atividades de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e estímulo à inovação, inclusive para gerir administrativa e financeiramente essas atividades, ou para contratação de instituição dedicada à recuperação social da pessoa presa, desde que o contratado tenha inquestionável reputação ética e profissional e não tenha fins lucrativos;
Em seguida, cita-se como exemplo do inciso XVI a contratação direta para o fornecimento das vacinas contra o coronavírus (Sars-Cov-2), as quais foram produzidas pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e pelo Instituto Butantan.
XVI – para aquisição, por pessoa jurídica de direito público interno, de insumos estratégicos para a saúde produzidos por fundação que, regimental ou estatutariamente, tenha por finalidade apoiar órgão da Administração Pública direta, sua autarquia ou fundação em projetos de ensino, pesquisa, extensão, desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e de estímulo à inovação, inclusive na gestão administrativa e financeira necessária à execução desses projetos, ou em parcerias que envolvam transferência de tecnologia de produtos estratégicos para o SUS, nos termos do inciso XII docaputdeste artigo, e que tenha sido criada para esse fim específico em data anterior à entrada em vigor desta Lei, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado.
Além de todos os incisos apresentados, o artigo 75 ainda prevê mais uma série de normas em seus parágrafos, conforme se demonstra.
Infere-se, do parágrafo primeiro do artigo 75, que os conceitos de unidade gestora e de ramo de atividade devem ser definidos pelo próprio órgão, sendo, portanto, ato discricionário.
§ 1º Para fins de aferição dos valores que atendam aos limites referidos nos incisos I e II do caput deste artigo, deverão ser observados:
I – o somatório do que for despendido no exercício financeiro pela respectiva unidade gestora;
II – o somatório da despesa realizada com objetos de mesma natureza, entendidos como tais aqueles relativos a contratações no mesmo ramo de atividade.
O parágrafo segundo, por sua vez, prevê que, caso a contratação seja realizada por consórcio público, há a possibilidade de duplicar dos valores estabelecidos no caput do artigo 75. Isso ocorre a fim incentivar, por exemplo, que as prefeituras executem as contratações de forma conjunta, proporcionando mais facilidade e eficácia, especialmente em relação aos municípios pequenos.
§ 2º Os valores referidos nos incisos I e II do caput deste artigo serão duplicados para compras, obras e serviços contratados por consórcio público ou por autarquia ou fundação qualificadas como agências executivas na forma da lei.
Conforme se extrai do parágrafo terceiro, doravante, as dispensas licitatórias por valor devem ser preferencialmente eletrônicas, assim como devem ser lançadas no sistema para contratações a fim de que atinjam outros interessados, gerando uma disputa justa e que promova a contratação da melhor proposta pela Administração Pública.
§ 3º As contratações de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão preferencialmente precedidas de divulgação de aviso em sítio eletrônico oficial, pelo prazo mínimo de 3 (três) dias úteis, com a especificação do objeto pretendido e com a manifestação de interesse da Administração em obter propostas adicionais de eventuais interessados, devendo ser selecionada a proposta mais vantajosa.
O parágrafo quarto, por sua vez, expressa que, quando se tratar dos incisos I e II do artigo 75, o pagamento deve ser realizado, preferencialmente via cartão de pagamento. O objetivo de tal disposição é a facilidade tanto para a empresa como para o poder público, mostrando-se, inclusive, assemelhado com o setor privado.
§ 4º As contratações de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão preferencialmente pagas por meio de cartão de pagamento, cujo extrato deverá ser divulgado e mantido à disposição do público no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).
Embora o parágrafo quinto estabeleça a instituição de regulamentação específica nos casos de obras e serviços de engenharia de que trata a alínea ‘c’, do inciso IV, do artigo em comento, tal regulamento ainda não foi criado pelo Governo Federal.
§ 5º A dispensa prevista na alínea “c” do inciso IV do caput deste artigo, quando aplicada a obras e serviços de engenharia, seguirá procedimentos especiais instituídos em regulamentação específica.
O parágrafo sexto define o que pode ser enquadrado no inciso VIII e o que se deve entender por “emergencial”, deixando claro que até mesmo em uma contratação emergencial deve ser precedida de pesquisa de mercado, conforme expressa previsão do artigo 23 da Lei nº 14.133/2021. Ainda, tal dispositivo dispõe que deve ser apurada a responsabilidade administrativa dos agentes públicos que deram causa à situação emergencial, ou seja, deve ser aberto processo administrativo disciplinar para apurar essa responsabilização, e, caso seja comprovado dolo do agente causador, serão aplicáveis as sanções previstas na Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa).
§ 6º Para os fins do inciso VIII do caput deste artigo, considera-se emergencial a contratação por dispensa com objetivo de manter a continuidade do serviço público, e deverão ser observados os valores praticados pelo mercado na forma do art. 23 desta Lei e adotadas as providências necessárias para a conclusão do processo licitatório, sem prejuízo de apuração de responsabilidade dos agentes públicos que deram causa à situação emergencial.
Quando se tratar de serviço de manutenção de veículos ou fornecimento de peças no valor de até R$ 8.000,00 (oito mil reais), não há preocupação com o limite dos R$ 100.000,00 (cem mil reais) estipulado no inciso I. Todavia, isso não soa como um critério probo, pois permite brechas em que não haverá controle pelos órgãos de controle externo do poder público.
§ 7º Não se aplica o disposto no § 1º deste artigo às contratações de até R$ 8.000,00 (oito mil reais) de serviços de manutenção de veículos automotores de propriedade do órgão ou entidade contratante, incluído o fornecimento de peças.
Ademais, denota-se que, para a alienação de bens nas situações que não se enquadram na modalidade leilão, o artigo 76, em seu parágrafo sexto, cita as regras de dispensa de licitação:
a) dação em pagamento;
b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da Administração Pública, de qualquer esfera de governo, ressalvado o disposto nas alíneas “f”, “g” e “h” deste inciso;
c) permuta por outros imóveis que atendam aos requisitos relacionados às finalidades precípuas da Administração, desde que a diferença apurada não ultrapasse a metade do valor do imóvel que será ofertado pela União, segundo avaliação prévia, e ocorra a torna de valores, sempre que for o caso;
d) investidura;
e) venda a outro órgão ou entidade da Administração Pública de qualquer esfera de governo;
f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação e permissão de uso de bens imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente usados em programas de habitação ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgão ou entidade da Administração Pública;
g) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação e permissão de uso de bens imóveis comerciais de âmbito local, com área de até 250 m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) e destinados a programas de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgão ou entidade da Administração Pública;
h) alienação e concessão de direito real de uso, gratuita ou onerosa, de terras públicas rurais da União e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) onde incidam ocupações até o limite de que trata o § 1º do art. 6º da Lei nº 11.952, de 25 de junho de 2009, para fins de regularização fundiária, atendidos os requisitos legais;
i) legitimação de posse de que trata o art. 29 da Lei nº 6.383, de 7 de dezembro de 1976, mediante iniciativa e deliberação dos órgãos da Administração Pública competentes;
j) legitimação fundiária e legitimação de posse de que trata a Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017.
Para Meira: (2022) Além das regras constantes no artigo 75, a nova lei trouxe o planejamento para dentro do procedimento de dispensa de licitação, não bastando especificar o objeto, realizar a pesquisa de preços, montar o processo e seguir para a contratação. Caso o gestor mais empolgado em se utilizar dos novos limites de dispensa de licitação opte por adotar a Lei nº 14.133/2021, deverá saber que agora o planejamento está em todas as contratações, inclusive nas dispensas de licitação.
Doravante, com a expressa previsão do princípio do planejamento, a Administração Pública deve implementar o plano de contratação anual, objetivando racionalizar as contratações, garantir o alinhamento de estratégias e subsidiar a elaboração das respectivas leis orçamentárias. Assim, entende Carvalho (2023):
O planejamento das contratações públicas é indispensável para uma execução segura do orçamento de compras e aquisições sem que haja fracionamento de objeto e erros no que tange à escolha dos contratos a serem firmados. Nesse sentido, a lei prevê a elaboração de planos de contratação anual pelos entes públicos, a serem executados ao longo do exercício com a definição prévia de todas as necessidades daquele órgão ao longo do ano seguinte, inclusive com a projeção de gastos que deverão ser efetivados para a celebração destes contratos.
Além da Lei nº 14.133/2021, o Governo Federal, por meio da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, publicou o Regulamento da Dispensa (Instrução Normativa nº 67/2021), que dispõe sobre a dispensa de licitação na forma eletrônica e institui o sistema de dispensa eletrônica, no âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.
A referida Instrução Normativa traz a regra da dispensa de licitação em sua forma eletrônica, de modo que essa regulamentação é uma das grandes novidades trazidas pela Lei nº 14.133/2021, evidenciando que a dispensa eletrônica pode ser uma forma segura para se executar essa espécie de contratação direta. Em síntese, a regra é que, doravante, quando o Poder Público fizer uma dispensa motivada pelo valor, deverá ser eletronicamente.
Destaca-se, ainda, que a dispensa eletrônica, trazida como uma novidade pela Lei de Licitações e Contratos Administrativos, pode ser vista como um minipregão, por se tratar do lançamento em um sistema – compras.gov ou qualquer outro – que tenha integração com o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) –, em que o órgão lança o objeto de desejo da contratação e deixa por, no mínimo, 03 (três) dias úteis em aberto para que qualquer pessoa, física ou jurídica, possa apresentar propostas. No quarto dia, devem ser contabilizadas no mínimo 06 (seis) e no máximo 10 (dez) horas de disputa de lances entre os interessados.
3. A DISCRICIONARIEDADE DO GESTOR PÚBLICO NOS CASOS DE DISPENSA DE LICITAÇÃO NA LEI Nº 14.133/2021
Observa-se que algumas das opções que o gestor público passa a ter a partir do procedimento instituído pela Lei nº 14.133/2021, para a dispensa de licitação se vislumbra logo no inciso I do artigo 72, que prevê o processo de contratação direta e se aplica para a inexigibilidade de licitação e para a dispensa de licitação. Neste primeiro inciso, o legislador estipulou as seguintes exigências para a contratação direta: documento de formalização de demanda, e, se for o caso, estudo técnico preliminar; análise de riscos; termo de referência; e projeto básico ou projeto executivo.
Destaca-se, neste ponto, que, quando a letra da lei traz a expressão “se for o caso”, cabe ao gestor público a decisão. Ainda, infere-se que a regulamentação da dispensa de licitação em sua forma eletrônica – conforme Instrução Normativa nº 67/2021 – não trouxe alteração em sua redação, isto é, tal escolha continua a cargo dos gestores públicos.
Portanto, nesta situação, a decisão do gestor está nos documentos que constarão para autuação processual.
Este é um dos casos em que cabe a regulamentação interna, na qual a gestão institucional já define previamente a regra a ser utilizada nos processos que tramitam naquele órgão. Dessa forma, traz segurança para todos os agentes públicos que atuarão no processo de contratação, diminuindo as situações de erro e de interpretação equivocada no uso da Lei.
Em seguida, o inciso III do artigo 72 também coloca ao alvedrio do agente público a necessidade de parecer jurídico e técnico, ao passo que o termo “se for o caso” novamente aparece na norma, evidenciando a discricionariedade do gestor. Aqui, quando a decisão for pela desnecessidade de parecer jurídico, o gestor assume a responsabilidade desta decisão, perante os órgãos de controle e poder judiciário.
Com efeito, os incisos I e II do artigo 75 expõem hipóteses em que a discricionariedade do agente público se ascende, já que, em ambos os incisos, está prevista a competição, de modo que a Administração Pública pode optar por licitar ou dispensar. Para a tomada de tal decisão, nestes casos, pode ser observado o custo de uma licitação, citando-se como exemplo o caso em que o poder público necessita adquirir um bem de valor dentro dos limites do inciso II e deve ponderar para decidir o que é melhor para Administração Pública, se a realização da licitação ou o procedimento de dispensa.
Observa-se que essa discricionariedade na escolha entre a realização da licitação ou a dispensa licitatória é cabível nos casos constantes dos incisos do artigo 75, considerando que nestes existem outros fornecedores.
Após, o parágrafo primeiro do artigo 75 a lei traz diversas situações em que a tomada de decisão recai sobre o gestor público, conforme se observa de seu inciso I: “I – o somatório do que for despendido no exercício financeiro pela respectiva unidade gestora”.
O questionamento que o agente público deve fazer é: “qual a definição de unidade gestora?”. A Lei nº 14.133/2021 traz, em seu artigo 6º, múltiplos conceitos de termos empregados ao longo de seu teor, todavia, não cita a definição de unidade gestora. De acordo com o Glossário do Senado Federal, unidade gestora pode ser definida como: “Unidade orçamentária ou administrativa investida do poder de gerir recursos orçamentários e financeiros, próprios ou sob descentralização”. Neste caso, cita-se como exemplo uma prefeitura, que pode possuir como unidade gestora uma secretaria ou apenas a própria prefeitura como unidade gestora única, cabendo ao agente público a decisão de tal definição.
Essa discricionariedade concedida ao gestor público possui elevada importância, uma vez que uma das aferições dos limites de valor para enquadramento nos incisos I e II do artigo 75 é realizada pela unidade gestora.
O inciso II, do parágrafo primeiro, do artigo 75, dispõe: “II – o somatório da despesa realizada com objetos de mesma natureza, entendidos como tais aqueles relativos a contratações no mesmo ramo de atividade”.
O agente público deve fazer a seguinte pergunta: “O que se entende por mesmo ramo de atividade?”. Novamente, o legislador foi omisso, não prevendo tal definição no texto legal. Todavia, encontra-se o conceito na Instrução Normativa da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital (SEGES) nº 08/2023: “Considera-se ramo de atividade a linha de fornecimento registrada pelo fornecedor quando do seu cadastramento no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf), vinculada
I – à classe de materiais, utilizando o Padrão Descritivo de Materiais (PDM) do Sistema de Catalogação de Material do Governo federal; ou
II – à descrição dos serviços ou das obras, constante do Sistema de Catalogação de Serviços ou de Obras do Governo federal.”
Em âmbito federal, foi considerado o nível de código do material no catálogo, porém, cabe ao gestor público definir, em sua esfera, o que se entende por ramo de atividade. Conforme se denota da instrução normativa acima referida, o conceito de ramo de atividade é muito amplo, de modo que o agente público possui discricionariedade para eleger o critério de definição.
Por exemplo, denota-se a possibilidade de definir ramo de atividade tendo por base a classe do classe do de materiais, e não o código do material.
Neste caso, a definição escolhida pelo gestor dificulta o enquadramento nas hipóteses de dispensa de licitação por valor, o que proporciona mais segurança aos agentes públicos que executam o processo
Seguidamente, o parágrafo terceiro do artigo 75 dispõe:
§ 3º As contratações de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão preferencialmente precedidas de divulgação de aviso em sítio eletrônico oficial, pelo prazo mínimo de 3 (três) dias úteis, com a especificação do objeto pretendido e com a manifestação de interesse da Administração em obter propostas adicionais de eventuais interessados, devendo ser selecionada a proposta mais vantajosa.
Novamente, a lei traz uma situação discricionária, já que, diante do termo “preferencialmente”, conclui-se que cabe ao gestor público a decisão de utilizar a forma eletrônica ou não.
1. A Instrução Normativa nº 67/2021 da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital (SEGES) prevê:
Art. 4º Os órgãos e entidades adotarão a dispensa de licitação, na forma eletrônica, nas seguintes hipóteses:
I – contratação de obras e serviços de engenharia ou de serviços de manutenção de veículos automotores, no limite do disposto no inciso I do caput do art. 75 da Lei nº 14.133, de 2021;
II – contratação de bens e serviços, no limite do disposto no inciso II do caput do art. 75 da Lei nº 14.133, de 2021;
III – contratação de obras, bens e serviços, incluídos os serviços de engenharia, nos termos do disposto no inciso III e seguintes do caput do art. 75 da Lei nº 14.133, de 2021, quando cabível.
Este regulamento demonstra que os órgãos devem adotar a obrigatoriedade do uso da dispensa eletrônica nos casos de enquadramento nos incisos I e II do artigo 75 (dispensa de licitação por valor). Contudo, o inciso III do referido regulamento traz a expressão “quando cabível”, deixando, portanto, a decisão dos demais incisos do artigo 75 ao alvedrio do gestor público.
Por fim, o parágrafo quarto do artigo 75 traz a seguinte redação:
§ 4º As contratações de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão preferencialmente pagas por meio de cartão de pagamento, cujo extrato deverá ser divulgado e mantido à disposição do público no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).
Mais uma vez se observa que a afirmação “preferencialmente”, o que significa que a decisão sobre a utilização do cartão de pagamento fica ao arbítrio do agente público.
Desse modo, observa-se que, na dispensa de licitação, inexiste competitividade, de modo que o gestor público opta pela não realização do processo licitatório, o que evidencia sua acentuada discricionariedade.
Diante disso, fica claro que além da discricionariedade do gestor público, cabe salientar e analisar o Planejamento, que além de vir com princípio na Lei, é considerado um fator preponderante para tomar a decisão.
Diante disso, o presente estudo se revela de suma importância, considerando, especialmente, o período de vacância da Lei nº 14.133/2021, assim como o protagonismo que gestor público assume doravante.
4. ASPECTOS METODOLÓGICOS
O escopo da presente pesquisa é apresentar ao gestor público os aspectos discricionários para tomada de decisão em relação à utilização da dispensa de licitação. Diante disso, a primeira etapa será a descrição e a contextualização histórica da licitação. Em seguida, passa-se às definições contemporâneas, isto é, à apresentação da atual legislação em vigor sobre a matéria. Após, inicia-se o estudo sobre as hipóteses legais de contratação direta, trazendo um panorama sobre a inexigibilidade de licitação e a dispensa de licitação, sendo que esta passa a ser o foco do estudo. Na sequência, o comparativo entre as Leis nº 8.666/1993 e nº 14.133/2021 possibilita a análise aprofundada sobre o objetivo central da pesquisa, isto é, a discricionariedade do gestor público na tomada e decisão no âmbito da dispensa de licitação.
Para tanto, a pesquisa documental será o destaque, já que a análise dos temas acima descritos depende da interpretação da legislação e dos regulamentos que tratam sobre a matéria.
Conforme Cellard (2008):
O documento escrito constitui uma fonte extremamente preciosa para todo pesquisador nas ciências sociais. Ele é, evidentemente, insubstituível em qualquer reconstituição referente a um passado relativamente distante, pois não é raro que ele represente a quase totalidade dos vestígios da atividade humana em determinadas épocas. Além disso, muito frequentemente, ele permanece como o único testemunho de atividades particulares ocorridas num passado recente.
Para este estudo, os seguintes documentos serão interpretados e analisados:
- Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos);
- Lei nº 8.666/1993 (Regulamentava o artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal e instituía normas para licitações e contratos da Administração Pública);
- Instrução Normativa nº 73/2022;
- Instrução Normativa da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital (SEGES) nº 67/2021.
5. CONCLUSÃO
O artigo em questão vem demonstrar que na Lei nº 14.133/2021, Lei geral de Licitações e Contratos, existe uma possibilidade taxativa de renunciar à licitação, deixar a regra (licitar) de lado para dispensar uma licitação. Essa discricionariedade, tema principal do artigo, mostra que o gestor precisa ficar atento para tomar suas decisões, tendo em vista que sempre na dispensa de licitação exige a competição, e o gestor que define se terá o processo licitatório.
Todos os casos têm melhores benefícios e desvantagens, e a decisão do gestor público deve ser no melhor interesse público, na maior vantajosidade para a Administração, sempre analisando e tomando a decisão no objeto final, seja um serviço ou aquisição, a fim de que a Administração saia ganhando, com transparência, eficiência, eficácia e com o menor dispêndio dentro do serviço Público.
Vinicius Saldanha Geronasso é Administrador especializado em licitações e contratos administrativos. Servidor público há 10 anos na esfera Federal, atualmente, como Diretor da Diretoria de Materiais e Patrimônio da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Atua na área de contratações públicas, em funções de planejamento, gestão, contratos, pregoeiro, presidente de comissão de licitação, atualmente também responsável por Patrimônio e Almoxarifado da Universidade. Especialização em Docência do Ensino Superior. Mestrando em Administração Pública pela UTFPR.
REFERÊNCIAS
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