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A pesquisa de preços na Lei nº 13.303/2016: uma visão jurídica
- 18 de novembro de 2020
- Posted by: Inove
- Category: Conteúdos
A estimativa de preços realizada pela Administração tem o condão de verificar quais parâmetros estão sendo cobrados pelo mercado, buscando-se o balizamento para os itens a serem licitados, com o objetivo de obter a contratação mais vantajosa e, ao mesmo tempo, eficaz na sua execução.
Além disso, serve de parâmetro para avaliar a disponibilidade orçamentária, de maneira que a cotação de preços é a etapa principal do processo e é precedida de ampla pesquisa pública de mercado, sendo utilizando para tanto, os mais diversos parâmetros, nos termos do art. 31, §3º[1] e art. 66, §1º[2], ambos da Lei nº 13.303/2016.
Nessa toada, a pesquisa de preços deve ser realizada, prioritariamente, a partir da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em banco de dados e sistema específico instituído para o setor ou em pesquisa de mercado.
Dessa maneira, a previsão legal é no sentido de que a estimativa de custo global seja apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em banco de dados e sistema específico instituído para o setor ou em pesquisa de mercado, parâmetros que foram inspirados ainda na Instrução Normativa SLTI nº 05/2014.
Com o advento da Instrução Normativa nº 73/2020[3], e a revogação da já referida IN 05/2014, apesar da redação ter sido levemente alterada, a essência se manteve, de modo que no seu art. 5º traz os parâmetros para realização da cotação de preços, que podem ser empregados de forma combinada ou não. São eles: Painel de Preços, disponível no endereço eletrônico gov.br/paineldeprecos, desde que as cotações refiram-se a aquisições ou contratações firmadas no período de até 1 (um) ano anterior à data de divulgação do instrumento convocatório; aquisições e contratações similares de outros entes públicos, firmadas no período de até 1 (um) ano anterior à data de divulgação do instrumento convocatório; dados de pesquisa publicada em mídia especializada, de sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo, desde que atualizados no momento da pesquisa e compreendidos no intervalo de até 6 (seis) meses de antecedência da data de divulgação do instrumento convocatório, contendo a data e hora de acesso; pesquisa direta com fornecedores, mediante solicitação formal de cotação, desde que os orçamentos considerados estejam compreendidos no intervalo de até 6 (seis) meses de antecedência da data de divulgação do instrumento convocatório.
Importa registrar que a IN 73/2020 foi inovadora em adiantar que o Painel de Preços e as aquisições e contratações similares de outros entes públicos são os parâmetros prioritários de utilização.
Necessário, ainda, abrir um pequeno parênteses sobre a aplicação da Instrução Normativa 73/2020 às empresas estatais: o normativo é expresso ao dispor que se aplica ao o procedimento administrativo para a realização de pesquisa de preços para a aquisição de bens e contratação de serviços em geral, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Destarte, caso a empresa pública ou sociedade de economia mista queira usar dos parâmetros e procedimentos trazidos pela IN, recomenda-se que a norma seja “recepcionada” em ato interno ou no próprio regulamento interno de licitações e contratos, nos termos do art. 40 da Lei nº 13.303/2016. Havendo, ainda, a opção de não adotar a IN 73/2020 mas elaborar norma própria sobre o procedimento de orçamentação, haja vista que o art. 31, §3º tem redação ampla e não detalha padrões aceitáveis de prazos e parâmetros para aferição do preço referencial.
Retornando à pesquisa de preços, a Lei nº 13.303/2016 reforça a necessidade de pesquisa ampla, não apenas se restringindo aos fornecedores, o que foi corroborado pelo Tribunal de Contas da União[4], que reiterou que “a pesquisa de preços para elaboração do orçamento estimativo de licitação promovida por empresa estatal não deve se restringir a cotações realizadas junto a potenciais fornecedores, devendo ser utilizadas outras fontes como parâmetro (art. 31, caput, §3º, da Lei 13.303/2016)”.
Nessa esteira, considerando a previsão legal de que a estimativa de custo poderá ser apurada por meio da pesquisa de mercado, é de se combater, inicialmente, a crença que a cotação de mercado é suficiente com a existência de três orçamentos, inclusive porque a pesquisa com eventuais fornecedores é a última espécie elencada pelo dispositivo[5].
Nesse sentido, o Tribunal de Contas da União[6] já orientou, sob a égide da Lei nº 8.666/93[7], que o orçamento do objeto a ser licitado deve ser elaborado com base em uma cesta de preços aceitáveis, oriunda, por exemplo, de pesquisa em catálogos de fornecedores, pesquisa em bases de sistemas de compras, avaliação de contratos recentes ou vigentes, valores adjudicados em licitações de outros órgãos públicos, valores registrados em atas de SRP e analogia com compras/contratações realizadas por corporações privadas, desde que, com relação a qualquer das fontes utilizadas, sejam expurgados os valores que manifestamente não representem a realidade do mercado, e foi pontual ao expor que,
Ainda conforme constatação do TCU esposada no Guia de Boas Práticas, há uma crença disseminada entre os gestores públicos de que basta haver três propostas de fornecedores para que uma estimativa de preço seja considerada válida. Todavia, conforme o citado nos acórdãos, deve-se buscar o maior número de preços possível, não se limitando a três preços informados por fornecedores, a menos que seja devidamente justificado.
Incontroverso, portanto, que a pesquisa ou cotação deve ser a mais ampla possível, e que a existência de três orçamentos não é suficiente para refletir a realidade do mercado, o que foi reiterado pelo TCU no Acórdão 1.548/2018 – Plenário[8].
Para que se parametrize uma cesta de preços, podemos objetivamente delinear o que o Tribunal de Contas da União considera como aceitável: a estimativa de preços baseada em pesquisas diretas com fornecedores ou em seus catálogos, valores adjudicados em licitações de órgãos públicos, sistemas de compras, valores registrados em atas de SRP, avaliação de contratos recentes ou vigentes, compras e contratações realizadas por corporações privadas em condições idênticas ou semelhantes, o que foi esposado no Acórdão 2.637/2015 – Plenário.
Desta maneira, a Lei das Estatais é contundente em expor meios eficazes de realizar pesquisa de preço, buscando afastar, ao máximo, a praxe de cotação de preços a partir de três orçamentos, de maneira que positiva a jurisprudência do Tribunal de Contas da União em prever que uma cesta de preços aceitáveis é decorrente de pesquisa fundamentada em informações de diversas fontes propriamente avaliadas, como, por exemplo, cotações específicas com fornecedores, contratos anteriores do próprio órgão, contratos de outros órgãos e, em especial, os valores registrados no Sistema de Preços Praticados do SIASG e nas atas de registro de preços da Administração Pública Federal, de forma a possibilitar a estimativa mais real possível.
Por fim, há que se atentar que a estimativa do valor de contratações deve contemplar todos os itens necessários e suficientes, de forma a refletir com precisão os serviços ou bens que se pretende contratar, evitando-se a pesquisa de preço desatualizada e inconsistente[9], de maneira que não haja defasagem muito grande entre a data do orçamento-base e a data da licitação, haja vista que, como o orçamento da Administração serve como critério de aceitabilidade de preços, se o orçamento-base estiver desatualizado, a licitação pode não atrair empresas interessadas, ou as propostas podem ser desclassificadas[10].
Renila Lacerda Bragagnoli é Advogada da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba – Codevasf. Chefe da Unidade de Assuntos Administrativos (Consultivo) da Assessoria Jurídica. Mestranda em Direito Administrativo e Administração Pública pela Universidade de Buenos Aires/UBA (2019-2021) Especialização (2018) em Políticas Públicas, Gestão e Controle da Administração pelo Instituto Brasileiro de Direito Público (IDP/DF).
[1] Art. 31 […] §3º No caso de inviabilidade da definição dos custos consoante o disposto no §2º, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em banco de dados e sistema específico instituído para o setor ou em pesquisa de mercado.
[2] Art. 66 […] §2o O registro de preços observará, entre outras, as seguintes condições: I – efetivação prévia de ampla pesquisa de mercado;
[3] Disponível em https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/instrucao-normativa-n-73-de-5-de-agosto-de-2020-270711836
[4] Acórdão 2102/2019 Plenário.
[5] Recorda-se, inclusive, que a revogada IN 05/2014 trazia em seu art. 2º, §6º que excepcionalmente, mediante justificativa da autoridade competente, será admitida a pesquisa com menos de três preços ou fornecedores.
[6] Acórdão 819/2009 – Plenário.
[7] Rememoramos também que, não obstante à vedação à aplicação subsidiária da Lei nº 8.666/93 para interpretações da Lei das Estatais, a jurisprudência consolidada do TCU em matérias de licitações e contratos é amplamente aceitável e pode ser usada como fonte de interpretação em temas práticos.
[8] “9.3.1. realização de pesquisa de preços de mercado, para fins de elaboração do orçamento estimativo da contratação, restrita a informações fornecidas por três empresas prestadoras de serviço, desprezando fontes adicionais de informação, a exemplo de contratações públicas similares, sistemas referenciais de preços disponíveis, pesquisas na internet em sites especializados e contratos anteriores do próprio órgão, o que contraria a jurisprudência do TCU, a exemplo do Acórdão 2.787/2017-TCU-Plenário e do Acórdão 3.684/2014-TCU-2ª Câmara”.
[9] Acórdão 648/2010 – TCU Plenário
[10] Acórdão 2.593/2013 – TCU Plenário