Alterações Contratuais na Nova Lei de Licitação: Preços e Critérios de Pagamento
- 15 de junho de 2021
- Posted by: Inove
- Category: Conteúdos
Resumo: A pesquisa tem como objetivo debater os principais aspectos acerca das alterações unilaterais ou bilaterais dos contratos administrativos, a repactuação de preços e o microssistema de pagamentos dos contratos, diante da nova Lei nº 14.133/2021. Serão abordados os dispositivos abarcados no Título III, Capítulo VII e X, em especial, destacando os pontos de divergência em relação à Lei nº 8.666/93.
Palavras-chaves: Alterações contratuais. Preços. Pagamentos.
Abstract: The research intends to discuss the main aspects about the unilateral or bilateral changes in administrative contracts, the renegotiation of prices and the microsystem of payments of contracts, considering the new Law nº 14.133/2021. The normative acts inserted in the Title III, Chapter VII and X will be commented, in particular, the aspects of divergence in relation to Law nº 8.666/93.
Keywords: Contractual changes. Prices. Payments.
1 – Alterações contratuais sob a ótica da Lei nº 14.133/2021
Devemos analisar o escopo da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos por meio de novos olhares, ainda que estejamos diante de normas que, em grande parte, representem uma reprodução de dispositivos contidos na Lei nº 8.666/93.
É bastante comum termos a equivocada ideia de que a Administração Pública sempre irá obter o melhor preço nos contratos fornecimento de bens, prestação de serviços, e realização de obras. No entanto, quanto mais complexo for o objeto contratado e burocrático o procedimento licitatório, os preços ofertados irão ser revestidos de incertezas sobre sua adequação.
Importante destacar que, diante da possibilidade de alterações unilaterais do contrato, como cláusulas exorbitantes que são, a doutrina[1] reconhece que o contratado, diante desta incerteza e dos riscos envolvidos, pode dispor de três medidas: internalizar, ressegurar, ou repassar os custos. É internalizado quando o contratado nada pode fazer além de suportar as modificações impostas pelo Poder Público. Nesse caso, certamente a incerteza do risco assumido recairá para os preços iniciais ofertados. No segundo caso, o ordenamento jurídico poderá funcionar como uma espécie de resseguro, mas com elevados custos de transação. E no terceiro caso, o preço adicional vai ser repassado pelo contratado para o tomador do serviço que, se estivermos diante do fornecimento de serviços públicos, recairá sobre usuário final.
Não obstante, apesar da imperfeição da Lei nº 8.666/93, as cláusulas exorbitantes que recaem sobre o contrato administrativo, em especial, a prerrogativa do Poder Público para alterar unilateralmente o contrato, dispõem de um quadrante normativo semelhante às hipóteses contidas na Lei nº 14.133/2021.
A alteração unilateral cinge-se diante da competência da Administração Pública contratante que é autorizada, por lei, a impor ao contratado determinadas modificações na execução do contrato administrativo durante a sua vigência. Trata-se de um instrumento para que o objeto do contrato seja adaptado a necessidades factuais e superveniente a sua celebração. Deve respeitar o edital, a proposta vencedora, bem como o contrato a si mesmo.
O art. 124, I, da Lei nº 14.133/2021, prescreve exaustivamente as situações em que se tornam possíveis as alterações unilaterais pela Administração, que irão ocorrer quando houver modificação do projeto ou das especificações (alteração qualitativa); ou quando for necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição do objeto (alteração quantitativa). Há de se frisar que apenas nessas hipóteses é que poderão ocorrer alterações unilaterais pelo ente público, quando não houver alternativa para a fiel execução do objeto do contrato, cabe ao Poder Público, dentro dos limites da lei e de forma vinculada, realizar a alteração unilateral.
Não podemos olvidar que certos requisitos devem ser obrigatoriamente observados pelo Poder Público na alteração unilateral. A necessidade de motivação é um requisito basilar que se encontra previsto no caput do art. 124, haja vista a necessidade de serem apresentadas as devidas justificativas para alteração contratual.
De igual forma, a alteração contratual deve decorrer de um fato superveniente, pois, entendendo diversamente, tal situação poderia caracterizar uma violação à competitividade no processo licitatório, diante da alteração do objeto por um fato previamente já conhecido pela Administração Pública.[2]
A alteração unilateral não é um ato discricionário do Poder Público. É necessário comprovar que o fato superveniente irá corresponder à medida de alteração e, principalmente, a demonstração do nexo de causalidade entre o fato superveniente e a medida de alteração.
É indispensável expor o motivo justificador da alteração unilateral, bem como a validade da alteração demanda a sua formalização, por termo aditivo no contrato, como condição para execução das alterações.
Destaca-se, também, um requisito decorrente de inovação pontual da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, no que diz respeito à impossibilidade de descaracterização do objeto contratual por meio de alterações unilaterais, onde não há previsão semelhante na Lei nº 8.666/93, embora já houvesse entendimento jurisprudencial e doutrinário nesse sentido. O art. 126 prescreve que tais alterações unilaterais não poderão transfigurar o objeto da contratação.
As alterações qualitativas ocorrem quando há uma modificação do projeto ou das especificações do objeto, acarretadas por fatos supervenientes, e que imprescindíveis para garantir a fiel execução do contrato.
As alterações quantitativas, por sua vez, irão repercutir em um acréscimo ou diminuição do objeto previamente contratado, nos limites permitidos em lei. É dizer: as alterações quantitativas não irão modificar o projeto ou as especificações do objeto, mas sim uma modificação na quantidade inicialmente contratada e a sua repercussão, para mais ou para menos, no valor contratual.
Como bem destacado por Ronny Charles, a realidade da Administração Pública demonstra que, na prática, as alterações qualitativas também podem gerar alterações quantitativas no valor contratual, se caracterizando como uma alteração qualitativa-quantitativa.[3]
Segundo a Lei nº 14.133/2021, em seu art. 125, tanto as alterações quantitativas como as qualitativas devem estar delimitadas pelos percentuais de até 25% do valor inicial atualizado do contrato, seja para acréscimos ou supressões, que se fizerem nas obras, nos serviços ou nas compras, e, no caso de reforma de edifício ou de equipamento, o limite para acréscimos será de 50%.
Já não subsiste mais a divergência existente ao tempo da Lei nº 8.666/93, no que diz respeito à possibilidade de as alterações qualitativas ultrapassarem os limites percentuais, haja vista a lei anterior fazer menção apenas para as alterações quantitativas.
Destaca-se, por oportuno, que nas alterações contratuais para supressão de obras, bens ou serviços, se o contratado já houver adquirido os materiais e os colocado no local dos trabalhos, a Administração Pública deverá realizar o pagamento pelos custos de aquisição regularmente comprovados e monetariamente reajustados, podendo, desde que devidamente comprovados, caber indenização por outros danos eventualmente decorrentes da supressão.
Uma novidade relativa às limitações das alterações unilaterais também se encontra presente no art. 127 da Lei nº 14.133/2021, que abarca as situações em que o contrato não contemple preços unitários para obras ou serviços que necessitem de aditamento. Esses serão fixados por meio da aplicação da relação geral entre os valores da proposta e o do orçamento-base da Administração sobre os preços referenciais ou de mercado vigentes na data do aditamento, respeitados os limites estabelecidos no art. 125.[4]
Com efeito, a mutabilidade dos contratos administrativos também é possível se concretizar por meio de acordo entre as partes, ou seja, de forma bilateral.
As alterações por acordo entre as partes poderão ocorrer diante das situações em que se esteja discutindo: a) a substituição da garantia de execução; b) a modificação do regime de execução da obra ou do serviço, bem como do modo de fornecimento; c) a modificação da forma de pagamento por imposição de circunstâncias supervenientes; d) o reestabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato, conforme previsão do inciso II do art. 124.
Há de se ressaltar que nada impede que as hipóteses previstas para os casos de alteração unilateral também possam ser realizadas consensualmente entre os contratantes. A consensualidade para alteração contratual tende a gerar ganho de eficiência para as partes, bem como a redução dos custos de transação.
Apenas as alterações unilaterais, qualitativas ou quantitativas, é que estão delimitadas pelos parâmetros percentuais do valor inicial do contrato fixados pela Lei nº 14.133/2021. O contratado não é obrigado a aceitar aumento superior. Porém, não podemos descuidar que as alterações bilaterais devem ser interpretadas de forma sistemática e à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Admitir o acréscimo ou supressão em alterações consensuais e em percentuais maiores que os fixados em lei, certamente, desvirtuaria os parâmetros da vantajosidade e tudo que foi estabelecido no procedimento licitatório, estaríamos diante de situações que podem ser caracterizadas como fraude.
No que tange às situações que decorram de falhas de projeto, as alterações de contratos de obras e serviços de engenharia irão ensejar a apuração da responsabilidade do responsável técnico, inclusive, com a adoção de providências necessárias para o ressarcimento dos danos causados à Administração Pública, sendo uma novidade normativa advinda pela Nova Lei de Licitações e Contratos.
Nesse sentido, a novel legislação também prescreve que, nos casos de contratações de obras e serviços de engenharia, deve ser observada a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato quando a execução for obstada por conta do atraso na conclusão de procedimentos de desapropriação, desocupação, servidão administrativa ou licenciamento ambiental, ou por circunstâncias alheias ao contratado.
Os dispositivos acrescidos se tratam, em verdade, da positivação da jurisprudência pátria, de atos normativos secundários e dos ensinamentos doutrinários. Assim, os parágrafos primeiro e segundo do art. 124 tem como finalidade propiciar uma maior segurança jurídica para o Poder Público e o contratado.
Prosseguindo, há de se ressaltar a previsão normativa do art. 128, da Lei nº 14.133/2021, que busca mitigar os efeitos do jogo de planilha praticado pelos licitantes. O dispositivo mencionado estabelece que nas contratações de obras e serviços de engenharia, a diferença percentual entre o valor global do contrato e o preço global de referência não poderá ser reduzida em favor do contratado em decorrência de aditamentos que modifiquem a planilha orçamentária, de modo a impedir que os aditamentos contratuais possam majorar, de forma fraudulenta, o lucro do contratado.
Essa previsão, contudo, já se fazia presente no Decreto nº 7.983/2013 que, em seu art. 14, caput, estabelece redação semelhante à prevista no art. 128 da Nova Lei de Licitações. Destaca-se que o parágrafo único do art. 14 do Decreto nº 7.983/2013 preconiza que, nos casos em que sejam adotados os regimes de empreitada por preço unitário e tarefa, a diferença percentual entre o valor global do contrato e o preço global poderá ser reduzida para a preservação do equilíbrio econômico-financeiro do contrato em casos excepcionais e justificados, desde que os custos unitários dos aditivos contratuais não excedam os custos unitários do sistema de referência utilizado, sendo assegurada a manutenção da vantagem da proposta vencedora ante a da segunda colocada na licitação.
Ademais, a jurisprudência do Tribunal de Contas de União[5] demonstra que é necessário que exista parecer técnico justificando a real necessidade de alteração contratual e, também, o aditivo contratual seja examinado pela procuradoria jurídica do órgão competente. Os preços dos aditivos contratuais devem estar acompanhados por um orçamento específico detalhado em planilhas elaboradas pelo responsável da licitação, que deverá explicitar os acréscimos e supressões de serviços.
Sem embargo, o jogo de planilha subsiste nas situações em que há uma grande assimetria de informações ente o Poder Público e o particular. A prática ocorre quando o licitante passa a atribuir preços unitários abaixo dos valores de mercado para os serviços que, supostamente, não precisarão ser executados ou que terão os quantitativos minorados. Por outro lado, o licitante irá elevar excessivamente os preços unitários dos serviços que, em regra, necessitarão ter os seus quantitativos aumentados por meio de alterações contratuais[6].
Desse modo, o art. 128 da nova lei pretende coibir os jogos de planilha, ao passo que proíbe que o desconto original entre o valor global da proposta e do orçamento estimado possa ser reduzido diante do aumento da quantidade de um serviço específico ao qual foi atribuído preço unitário mais elevado[7].
As alterações contratuais também irão repercutir em um elemento basilar dos contratos, pois, caso haja aumento ou diminuição do objeto, deverá ser reestabelecido, no mesmo termo aditivo, o equilíbrio econômico-financeiro. A equação econômico-financeira constitui uma “precificação” dos encargos em face das oportunidades de ganhos previstos no regime remuneratório ao contratado.
O direito ao reequilíbrio econômico-financeiro não surge, exclusivamente, diante de alterações contratuais realizadas de forma unilateral pela Administração Pública. A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos estabelece que o contrato poderá dispor de uma cláusula relativa à matriz de riscos[8], sendo esta responsável por definir os riscos e responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato.
O equilíbrio econômico-financeiro dos contratos cinge-se em torno das compensações de uma parte a outra, na ocorrência de eventos que configurem um ato atribuído a um contratante, mas que impacte, de um modo econômico e financeiro, a outra parte. Há de se ressaltar que não são apenas os eventos gravosos geram direito à recomposição ao equilíbrio econômico-financeiro. Muitas vezes, eventos benéficos para ambas as partes, ou apenas para uma delas, podem gerar o direito ao reequilíbrio do contrato.[9]
O processo de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro terá como objetivo restabelecer a condição anterior à ocorrência dos aditivos contratuais, utilizando como referência a representação do contrato em estado de equilíbrio.
Por conseguinte, em seu art. 131, a nova lei prescreve que, ainda que o contrato administrativo seja extinto, tal circunstância não representará óbice para que seja reconhecido o direito ao equilíbrio econômico-financeiro, hipótese em que o contratado receberá uma indenização por meio de termo indenizatório.
Contudo, o parágrafo único do dispositivo supracitado menciona que o pedido de restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro deve ser realizado ainda durante a vigência do contrato, inclusive, antes de eventual prorrogação, para os contratos de serviços e fornecimentos contínuos.
No entanto, é preciso ressaltar que, nos casos em que a proposta apresentada pelo contratado apresente um preço inexequível para determinado serviço, não será possível que as partes repactuem o preço previamente acordado, pois, ao ser aceita a proposta pela Administração Pública, a equação econômico-financeira é materializada, sendo protegida e assegurada por força de lei.
O desequilíbrio da equação econômico-financeira deve ocorrer diante de um evento posterior à formulação da proposta inicial, a insuficiência do preço inexequível informado no momento inicial do contrato não é apta a ensejar o rompimento da equação econômico-financeira. Para que ocorra a alteração dos preços e o reequilíbrio do contrato, a elevação dos encargos não deve decorrer de conduta dolosa ou culposa imputável ao contratado.
Para garantir maior segurança ao licitante vencedor, ainda nas hipóteses de alterações unilaterais, há de se frisar importante norma que, diante de previsão semelhante na Lei nº 8.666/93, irá contribuir para a redução de litígios judiciais em contratos complexos e vultosos. O art. 132 estabelece como condição necessária para alterações contratuais que seja formalizado o termo aditivado para, só assim, se tornar possível a exigência de execução, pelo contratado, das prestações determinadas pela Administração Pública.
Apenas de forma excepcional, nos casos de justificada, é que se faz possível a antecipação dos efeitos das alterações contratuais sem que ocorra a imediata formalização do termo aditivo, que deverá ocorrer, impreterivelmente, no prazo máximo de 1 (um) mês.
Contempladas de forma expressa também na Lei nº 14.133/2021, as contratações integradas ou semi-integradas, por possuírem certas características, receberam um tratamento próprio pelo legislador para as alterações contratuais.
Nesse diapasão, há de se considerar o regime especial estabelecido pelo art. 133 da nova lei, que impõe, como regra, vedação no que tange à modificação dos valores contratuais quando estivermos diante de contratações integradas ou semi-integradas.
São ressalvadas quatro situações, bem delineadas pelo legislador, em que os valores poderão ser alterados nas contratações integradas ou semi-integradas: 1) para restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro decorrente de caso fortuito ou força maior; 2) por necessidade de alteração do projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos objetivos da contratação, a pedido da Administração, desde que não decorrente de erros ou omissões por parte do contratado, observados os limites de acréscimos e supressões de 25% que se fizerem nas obras, nos serviços ou nas compras, e, no caso de reforma de edifício ou de equipamento, o limite para acréscimos será de 50%; 3) por necessidade de alteração do projeto nas contratações semi-integradas, nos termos do §5º do art. 46; e 4) por ocorrência de evento superveniente alocado na matriz de riscos como de responsabilidade da Administração.
2 – Repactuação de preços e o microssistema de pagamentos dos contratos administrativos
Os preços estabelecidos nos contratos administrativos podem ser impactados por variáveis e fatores externos, principalmente quando estivermos diante de contratos de serviço continuado, que poderão ser afetados por conta da variação do custo de produção ou dos insumos utilizados. Daí que se torna imprescindível realizar uma adequação dos preços contratuais aos novos preços de mercado.
Desse modo, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, com o propósito de unificar a normatização acerca da repactuação dos preços, estabeleceu entre os artigos 134 e 136 alguns procedimentos que deverão ser observados pela Administração Pública e o contatado.
O art. 134 reproduz dispositivo que se assemelha ao art. 65, §5º, da Lei nº 8.666/93, ao afirmar que os preços serão alterados, para mais ou para menos, quando ocorrer a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais ou a superveniência de disposições legais, e que, comprovadamente, repercuta sobre os preços inicialmente contratados.
Por sua vez, o art. 135 trata acerca da possibilidade de repactuação dos preços contratuais para os serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra. Os parâmetros da repactuação dos preços, até então, encontrava amparo no Decreto nº 9.507/2018 para a adequação dos preços contratuais aos novos preços de mercado.
O art. 12 do Decreto nº 9.507/2018 admite o instrumento da repactuação para serviços continuados sob regime de mão de obra exclusiva, desde que seja observado o interregno mínimo de um ano das datas dos orçamentos para os quais a proposta se referir e, também, que seja demonstrada de forma analítica a variação dos componentes dos custos do contrato, devidamente justificada.
Para os contratos de serviço continuado sem dedicação exclusiva de mão de obra, o instrumento previsto pelo Decreto nº 9.507/2018 cinge-se no reajuste contratual. Nessa hipótese, o reajuste em sentido estrito também ocorre nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano. O reajuste consiste na aplicação de um índice de correção monetária, estabelecido no contrato, para retratar a variação efetiva do custo de produção através da adoção de índices específicos ou setoriais.
Nesse diapasão, o art. 135, da Lei nº 14.133/2021, sedimenta algumas regras já existentes, tal como o dever de observar o interregno mínimo de um ano para a repactuação, bem como acrescenta alguns requisitos para a repactuação dos preços para os serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, ou que tenha uma predominância de mão de obra.
Destaca-se a vedação imposta pelo §2º do artigo supracitado, que proíbe aos órgãos ou às entidades contratantes que se vinculem às disposições previstas nos acordos, convenções ou dissídios coletivos de trabalho que tratem de obrigações e direitos que somente se aplicam aos contratos com a Administração Pública.
Há de se ressaltar também a previsão do §4º, que permite a divisão da repactuação dos preços em tantas parcelas quantas forem necessárias. No entanto, condiciona a divisão diante da observância do princípio da anualidade do reajuste de preços da contratação, que podem ser realizadas em momentos distintos para discutir a variação de custos que tenham sua anualidade resultante em datas diferenciadas, tal como os preços decorrentes de mão de obra e os decorrentes dos insumos necessários para a execução dos serviços.
Prosseguindo, a Lei nº 14.133/2021, com contornos de novidade, estabelece em seu Capítulo X o quadrante normativo acerca dos pagamentos dos contratos administrativos. A existência de uma regulamentação própria para os pagamentos é uma inovação em relação à Lei nº 8.666/93.
Interessante, no particular, observar que a Administração Pública deve obedecer a uma ordem cronologicamente de pagamento, fixada pelo legislador, para cada fonte diferenciada de recursos, que deve ser subdividida nos contratos de fornecimento de bens, prestação de serviços, locações e realização de obras.
Apenas de forma excepcional é que se faz possível uma alteração da ordem cronológica de pagamento, necessitando que seja observado, ainda, a prévia justificativa da autoridade competente e posterior comunicação ao órgão de controle interno da Administração e ao Tribunal de Contas.
De forma taxativa, o legislador permitiu que a modificação da ordem de pagamento ocorra, exclusivamente, nas situações em que o Poder Público esteja diante de: a) grave perturbação da ordem, situação de emergência ou calamidade pública; b) pagamento a microempresa, empresa de pequeno porte, agricultor familiar, produtor rural pessoa física, microempreendedor individual e sociedade cooperativa, desde que demonstrado o risco de descontinuidade do cumprimento do objeto do contrato; c) pagamento de serviços necessários ao funcionamento dos sistemas estruturantes, desde que demonstrado o risco de descontinuidade do cumprimento do objeto do contrato; d) pagamento de direitos oriundos de contratos em caso de falência, recuperação judicial ou dissolução da empresa contratada; e) pagamento de contrato cujo objeto seja imprescindível para assegurar a integridade do patrimônio público ou para manter o funcionamento das atividades finalísticas do órgão ou entidade, quando demonstrado o risco de descontinuidade da prestação de serviço público de relevância ou o cumprimento da missão institucional.
Destarte, a excepcionalidade da alteração deve estar acompanhada de procedimentos que garantam a transparência da medida, tal como a necessidade de justificação adequada e comunicação aos órgãos competentes, bem como o dever que cabe à Administração Pública demonstrar que, se a alteração na ordem cronológica de pagamentos não ocorrer, poderá ocasionar um risco de descontinuidade do cumprimento do objeto do contrato.
Daí que, ao deixar de observar a ordem cronológica de pagamento e não estar inserido nas hipóteses excepcionais, tal conduta ensejará a apuração de responsabilidade do agente público.
Com o propósito de fortalecer a transparência e publicidade dos procedimentos licitatórios, a Lei nº 14.133/2021, em seu §3º, do art. 141, no que diz respeito à divulgação da ordem cronológica de pagamentos, estabelece que o órgão ou entidade responsável pela licitação deve disponibilizar, mensalmente, em seção específica de acesso à informação em seu sítio na internet, uma lista relativa à ordem que serão realizados os pagamentos, bem como as justificativas que fundamentarem a eventual alteração dessa ordem.
Destaca-se, também, a previsão normativa que condiciona a ocorrência do pagamento apenas diante da efetiva comprovação do fato gerador. Todavia, essa condicionante deve estar expressamente prevista no edital do procedimento licitatório ou no contrato administrativo.
Por outro lado, se a Administração estiver diante de casos que envolvam controvérsia sobre a execução do objeto, no que diz respeito à sua dimensão, qualidade e quantidade, a parcela incontroversa deve ser liberada conforme o prazo previamente estabelecido para o pagamento.
Tal medida, por certo, busca garantir uma maior eficiência aos mecanismos de pagamento do ente público, evitando que litígios contratuais obstem o recebimento de qualquer valor pelo contratado, gerando um dano desproporcional aos envolvidos. Portanto, o direito à liberação da parcela incontroversa, previsto no art. 143, da Lei nº 14.133/2021, representa uma importante norma de conduta que se compatibiliza com o princípio da boa-fé objetiva nas relações contratuais.
A adoção de remuneração variável também se faz presente na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos de forma expressa. Quando a Administração Pública estiver diante de contratos cujo objeto sejam a realização de obras, fornecimentos e serviços, inclusive de engenharia, será possível estabelecer remuneração variável vinculada ao desempenho do contratado. Deverão ser observados os índices de desempenho previstos com base nas metas, padrões de qualidade, e critérios de sustentabilidade ambiental e prazos entrega definidos no edital de licitação e no contrato.
Os indicadores de desempenho devem gerar incentivos econômicos para que o contratado pretenda executar o serviço de modo mais eficiente. Muito além de aplicação de sanções pecuniárias em caso de descumprimento dos indicadores, o sistema de pagamentos deve priorizar os descontos devidos ao contratado nos casos em que não houver cumprimento dos indicadores de desempenho, com fundamento na exceção de descumprimento do contrato.
Mauricio Portugal Ribeiro chama atenção para os casos em que ocorram diminuições da remuneração realizadas pelo Poder Público. O autor argumenta, sob um viés estritamente jurídico, que essas medidas não são caracterizadas como uma punição, mas sim uma redução do pagamento que se faz de modo proporcional ao serviço que efetivamente foi prestado. É preciso que conste expressamente no contrato as escalas de preços no caso do serviço não ser prestado nas quantidades e qualidades exigidas para garantir o recebimento do pagamento integral.[10]
Ainda, destaca-se que o §1º, do art. 144, da Lei nº 14.133/2021, prescreve que o pagamento poderá ser ajustado de acordo com o percentual sobre o valor economizado em determinada despesa, quando estiver diante de situações em que o objeto do contrato vise à implantação de processo de racionalização, onde, nessa situação, as despesas correrão à conta dos mesmos créditos orçamentários.
Não podemos olvidar que, ainda que a lei seja permissiva quanto a utilização de remuneração variável, é preciso que esta seja motivada e que respeite o limite orçamentário fixado pela Administração Pública para a contratação.
Dentre os dispositivos que regulamentam o microssistema de pagamentos dos contratos administrativos, A Lei nº 14.133/2021 também estabeleceu como regra a vedação ao pagamento antecipado, seja ele parcial ou total, relativo a parcelas contratuais vinculadas ao fornecimento de bens, à execução de obras ou à prestação de serviços.
Não obstante, as antecipações de pagamento poderão ocorrer de forma excepcional, desde que propicie sensível economia de recursos à Administração Pública, ou se representar condição indispensável para a obtenção do bem ou para a prestação do serviço. Atendendo um desses requisitos, a antecipação do pagamento deverá ser previamente justificada no processo licitatório e, de igual forma, estar expressamente prevista a sua possibilidade no edital de licitação ou no instrumento formal de contratação direta.
Como forma de garantir o adimplemento contratual pelo contratado, nos casos em que ocorrerem o pagamento antecipado, a Administração Pública poderá exigir a prestação de uma garantia adicional. Além do mais, caso o objeto do contrato não seja executado no prazo previsto, o valor que foi antecipado deverá ser devolvido.
Busca-se, em verdade, evitar fraudes e minorar eventual prejuízo ao Erário quando ocorrer a antecipação do pagamento e se a execução da obra, a prestação do serviço, ou o fornecimento de bens não for efetivamente realizado.
Marcos Nóbrega é Professor Adjunto de Direito da Faculdade de Direito do Recife (UFPE), Doutor em Direito (UFPE), Visiting Scholar na Harvard Law School, Harvard Kennedy School of Government e Massachusetts Institute of Technology (MIT). Conselheiro Substituto do Tribunal de Contas de Pernambuco (TCE-PE).
Pedro Dias de Oliveira Netto é Advogado. Doutorando em Direito (UFPE).
3 – Referências
NÓBREGA, Marcos. O Leviatã retroalimentado: quem paga a conta das Cláusulas Exorbitantes?. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/colunistas/marcos-nobrega/o-leviata-retroalimentado-quem-paga-a-conta-das-clausulas-exorbitantes>. Acesso em: 5 de maio de 2021.
NIEBUHR, Joel de Menezes (Coord.). Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 2. Ed. Curitiba: Zênite, 2021.
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Licitações e contratos administrativos: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
RIBEIRO, Mauricio Portugal. Concessões e PPPs: melhores práticas em licitações e contratos. São Paulo: Atlas, 2011.
RIBEIRO, Mauricio Portugal. O que todo profissional de infraestrutura precisa saber sobre o equilíbrio econômico-financeiro de concessões e PPPs, 2014. Disponível em: http://pt.slideshare.net/portugalribeiro/o-que-todo-profissional-de-infraestrutura-precisa-saber-sobre-equilibrio-economico-financeiro-versao-publicada-na-internet-39170396. Acesso em: 5 de maio de 2021.
TORRES, Ronny Charles Lopes de. Leis de licitações públicas comentadas. 11. Ed. Salvador: Juspodivm, 2021.
[1] NÓBREGA, Marcos. O Leviatã retroalimentado: quem paga a conta das Cláusulas Exorbitantes?. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/colunistas/marcos-nobrega/o-leviata-retroalimentado-quem-paga-a-conta-das-clausulas-exorbitantes>. Acesso em: 5 de maio de 2021.
[2] OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Licitações e contratos administrativos: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 146.
[3] TORRES, Ronny Charles Lopes de. Leis de licitações públicas comentadas. 11. Ed. Salvador: Juspodivm, 2021, p. 839.
[4] Na Lei n. 8.666/93, de forma diversa, o art. 65, §3º, determinava que, se no contrato não houverem sido contemplados preços unitários para obras ou serviços, esses serão fixados mediante acordo entre as partes, respeitados os limites estabelecidos.
[5] Acórdãos Plenários do TCU nº. 1.981/2009, 749/2010 e 1.200/2010.
[6] Para combater o jogo de planilhas, podemos mencionar o posicionamento do Tribunal de Contas da União que já adota, pelo menos, três métodos: o método do balanço, método do desconto e o método da comparação com a segunda licitante melhor classificada. De forma concisa, o método do balanço tem como finalidade manter inalteradas as condições estabelecidas pela licitação, isto é, busca assegurar as condições econômicas originalmente definidas. Por sua vez, o método do desconto tem como propósito a manutenção do desconto em termos percentuais do contrato original. Já o método da comparação com a segunda licitante melhor classificada parte da premissa de comparar a planilha contratual, após as alterações contratuais realizadas, com as anteriores propostas recebidas na licitação, verificando os quantitativos de serviços ofertados pelas licitantes em relação aos quantitativos do contrato aditado.
[7] NIEBUHR, Joel de Menezes (Coord.). Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 2. Ed. Curitiba: Zênite, 2021, p. 192.
[8] A Lei n. 14.133/2021, em seu art. 6º, XXVII, conceitua a matriz de riscos como sendo a “cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos supervenientes à contratação”.
[9] RIBEIRO, Mauricio Portugal. O que todo profissional de infraestrutura precisa saber sobre o equilíbrio econômico-financeiro de concessões e PPPs, 2014. Disponível em: http://pt.slideshare.net/portugalribeiro/o-que-todo-profissional-de-infraestrutura-precisa-saber-sobre-equilibrio-economico-financeiro-versao-publicada-na-internet-39170396. Acesso em: 5 de maio de 2021.
[10] RIBEIRO, Mauricio Portugal. Concessões e PPPs: melhores práticas em licitações e contratos. São Paulo: Atlas, 2011, p. 77.