O Plano Anual de Contratações e os desafios na sua operacionalização
- 21 de abril de 2021
- Posted by: Inove
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1 – INTRODUÇÃO
O contexto histórico do Plano Anual de Contratações – PAC se dá a partir de auditorias do Tribunal de Contas da União com o objetivo de identificar a situação da governança e da gestão de aquisições nos órgãos públicos, tendo evolução após o Acórdão do TCU Plenário nº 2.622, de 2015, o qual reforçou a necessidade de um documento que materializasse um plano de contratações[1]. Isso foi efetivado com a publicação da Instrução Normativa nº 01, de 2018, revogada em 2019, e com a Instrução Normativa nº 01, de 2019, vigente, ambas expedidas pela Secretaria de Gestão – SEGES, do Ministério da Economia.
De acordo com o normativo em vigor, o Plano Anual de Contratações – PAC é uma ferramenta de gestão que consolida todas as contratações e prorrogações que um Órgão pretende realizar no ano subsequente, independente do objeto a ser contratado. Importante lembrar que, em que pese a primeira Instrução Normativa sobre o PAC datar de 2018, a obrigatoriedade de implantação do PAC se deu apenas em 2019, com sua execução em 2020.
Nesse contexto, é relevante ressaltar que, um dos objetivos do Plano Anual de Contratações é permitir uma visão sistêmica sobre todas as demandas de compras do Governo, atuando na identificação da fragmentação das contratações/compras. Além disso, possibilita uma maior transparência dos gastos, dando mais publicidade às futuras contratações e buscando uma maior racionalização dos gastos públicos, como é dito pela Corte de Contas em seu Acórdão nº 1524/2019 – Plenário.
Diante disso, vale salientar que no cenário atual, no qual está se dando mais visibilidade ao planejamento e ao controle, apoiar-se em ferramentas como o Plano Anual de Contratações -PAC torna o processo de gestão nas aquisições mais objetivo e efetivo. Inquestionavelmente, o planejamento, alinhado às estratégias da organização, permite desenhar um caminho para chegar a um objetivo de forma mais eficiente e efetiva. A estratégia está ligada ao resultado e à forma eficaz de alcançá-lo. Por isso, seja diretamente ou indiretamente, o PAC deve estar totalmente integrado ao planejamento estratégico do órgão.
Entender esses detalhes ajudará no processo da mudança cultural da Administração Pública em torno do planejamento das contratações, auxiliando na criação das ferramentas certas para otimizar os resultados neste campo, como é o caso do PAC com o auxílio do Sistema de Planejamento e Gerenciamento das Contratações – SPGC. (LEONEZ, 2019 p. 39).
E este artigo surge com o objetivo de auxiliar na operacionalização do PAC, apresentando os pontos relevantes como instrumento gerencial, e o que pode ser aperfeiçoado ao longo do processo de planejamento.
2 – O PAC COMO INSTRUMENTO GERENCIAL
Considerando a experiência com a construção e execução de um Plano de contratações, é possível questionar o papel do PAC como instrumento gerencial, tendo em vista a forma de operacionalizá-lo atualmente. Isso porque, a cultura do planejamento ainda não está consolidada, e a operacionalização do PAC, por vezes, é enfadonha e trabalhosa, tornando-se um instrumento apenas para cumprimento das recomendações normativas.
Para melhor compreensão é necessário entender que o plano é desenhado dentro do Sistema de Gerenciamento e Planejamento de Contratações – SPGC, e o lançamento dos itens é feito com a indicação dos códigos CATMAT e CATSER[2], o que leva a uma obrigatoriedade de detalhamento pormenorizado de cada item que se pretende contratar ou prorrogar, e essa ação é uma das que leva ao questionamento de se realmente o PAC está sendo eficaz no seu papel de instrumento de gestão.
Inicialmente, é preciso entender que, para fins de registro das demandas no Plano Anual de Contratações, a classificação inicial deve ser com base na necessidade do Órgão, enquanto as possíveis soluções, para atendimento a essas necessidades, serão trabalhadas nas outras etapas do planejamento da contratação, buscando o resultado mais efetivo para a Administração. Com isso, objetiva-se maximizar os resultados e minimizar as deficiências e riscos envolvidos nas contratações, pois o PAC estabelece a ligação entre o planejamento e o resultado.
Contudo, esse registro inicial esbarra na limitação do SPGC, o qual exige o lançamento de item a item, utilizando o CATMAT e CATSER correspondente, o que, por vezes, trava o processo de planejamento e até influencia no lançamento real da necessidade da Administração, que na maioria das vezes não identifica o código correto, lançando o item com um código que mais se aproxima ao objeto desejado, influenciando até no valor preliminar, também lançado no SGPC.
Abaixo é possível visualizar os campos do SPGC a serem preenchidos quando da inclusão de itens no PAC:
Observando essa questão, percebe-se que ao escolher o objeto “caneta”, diversos códigos são disponibilizados para o mesmo item, isso, a nível operacional, trava o processo e dificulta a elaboração do PAC por exigir lançamentos com especificações detalhadas. Portanto, considerando o contexto da finalidade do PAC, entende-se que desvirtua o objetivo, exigindo maior tempo para pesquisas, detalhamento de especificações e nos lançamentos, tudo isso numa etapa que ainda não se tem a solução definida.
Ademais disso, é importante lembrar que, mesmo com a especificação trazida pelo código, ainda há o campo de preenchimento obrigatório da “Descrição sucinta do objeto”, ou seja, duplicando o mesmo tipo de informação e, por vezes, até trazendo informações incoerentes e discrepantes entre a descrição do código e a descrição constante nesse campo. Nesse caso, quando se vincula a necessidade a um código genérico, as especificações indispensáveis podem ser complementadas nesse campo “Descrição sucinta do objeto”, sem haver conflitos nas informações.
Logo, considerando isso, o melhor cenário vislumbrado seria a possibilidade de que o sistema PGC fosse alterado, no sentido de possibilitar o lançamento de forma menos complexa e trabalhosa, podendo adotar como solução: ou o uso da natureza de despesa[3] do item pretendido, para fins orçamentários, seja classificando de forma mais adequada a categoria de despesa – custeio ou capital[4], com uma visão mais macro; ou até mesmo, ativando os códigos genéricos para uso apenas no Sistema PGC, com códigos de sumarização para fins de consolidação das informações no Painel de Compras[5], exigindo-se os códigos mais específicos apenas quando da execução para a contratação de fato, ou seja, para lançamento no Portal de Compras do Governo (comprasnet).
Esses são pontos a serem analisados, verificando a possibilidade ou não de adequação do sistema, buscando sempre o aprimoramento das ferramentas que auxiliam a elaboração do Plano Anual de Contratações, principalmente considerando as diretrizes referentes ao plano de contratações existentes na futura lei de licitações, a qual leva essa realidade aos demais entes da federação.
Entretanto, apesar desse ponto sensível discutido acima, é possível identificar que o PAC está alcançando a finalidade de auxiliar na identificação da fragmentação das compras, sendo possível visualizar por meio dos planos de contratações as demandas comuns à diversos órgãos, e assim estimular mais contratações compartilhadas, buscando mais economia de escala e processual. Exemplo disso são as contratações centralizadas em andamento pela Central de Compras do Ministério da Economia.
Como é possível fazer essa identificação?
No site Painel de Compras, é possível filtrar por Unidade Administrativa de Serviços Gerais – UASG[6] e realizar a visualização de informações registradas do SPGC, possibilitando observar contratações em comuns dentro até mesmo do próprio órgão consultado, que possui mais de uma UASG vinculada, proporcionando uma compra conjunta nesse cenário.
Destacamos abaixo exemplo dos dados do Ministério da Economia cadastrados no PAC para um item específico – “caneta esferográfica”. Percebe-se que três outros órgãos vinculados ao ministério possuem a mesma demanda, o que facilita a identificação da fragmentação das compras:
Figura 2 Filtro Painel de Preços
3 – OPERACIONALIZAÇÃO DO PAC
Superada a discussão quanto a funcionalidade do PAC como instrumento gerencial, e partindo para a operacionalização, baseando-se nas diretrizes da Instrução normativa SEGES/ME nº 01/2019, é possível sugerir um fluxograma resumido do processo de construção do PAC:
Figura 3 Fluxo elaboração do PAC
Adentrando de forma mais detalhada no processo de execução do PAC, sugere-se outro fluxograma, agora para a fase de acompanhamento e controle da execução do PAC, com a finalidade de atuar nas correções de desvios e até mesmo na identificação de mecanismos para monitoramento de todo esse processo:
Figura 4 Fluxo de execução e controle do PAC
Com base nisso, é importante enfatizar que o Plano Anual de Contratações requer acompanhamento constante, e não é algo engessado. Entretanto, isso não justifica desrespeitar o processo de planejamento, pelo contrário, a instrução normativa reguladora do PAC, de forma geral, deixa claro limites a serem obedecidos durante todo o processo, seja de construção ou de execução.
Dessa forma, considerando que a norma criou etapas as serem seguidas, é necessário a criação de instrumentos de governança com o intuito de direcionar, monitorar e avaliar cada ação relacionada ao PAC. Seja, instituindo cronograma para cadastro e envio da demanda, consolidação de demandas pela unidade de compras, criação de unidades supridoras para centralizar determinados tipos de contratações, ou até mesmo criação de unidades ou comissões específicas responsáveis pelo planejamento das contratações.
4 – CONCLUSÃO
Nesse contexto, é importante observar que há diversas variáveis que impactam na execução do PAC: capacidade operacional, contingenciamento, cisão ou fusão de órgãos, descontinuidade de contratações, casos de calamidade pública etc. Mas, a medida que menos se dá importância a essa etapa no planejamento das contratações, e menos vincula às necessidades registradas no PAC com os objetivos estratégicos do órgão, a fim de atingir a missão institucional, menos relevância esse instrumento terá, tornando-se uma peça meramente fictícia.
Portanto, e tendo em vista a futura lei de licitações, a qual traz explicitamente a etapa de planejamento anual das contratações como um dos pontos atrelados aos aspectos de governança propostos pelo projeto, e que poderá ser adotada por cada ente federativo, é necessário considerar a realidade de cada instituição, a qual terá que criar o seu conjunto eficiente de mecanismos com a finalidade de assegurar que as ações a serem executadas dentro da sua realidade estejam sempre alinhadas com o planejamento estratégico do órgão e com o interesse público.
Logo, conclui-se que o PAC exige que as etapas de planejamento, execução e controle estejam alinhadas, é o início de um registro e gerenciamento mais realista das contratações sobre o orçamento, tendo em vista os gastos planejados, aperfeiçoando a máquina pública com foco num planejamento adequado e uma efetividade da execução das atividades, além da melhor administração da capacidade operacional, da gestão de risco e da alocação de recursos.
O fortalecimento do PAC como instrumento de gestão de cada organização, torna-se uma peça fundamental para as contratações, e a correção dos desvios no processo de planejamento, é um enorme desafio para quem atua diretamente na condução do plano, assim como para os gestores.
Portanto, quando se busca simplificar os mecanismos que auxiliam na operacionalização do PAC, desde sua construção até seu acompanhamento, mas benefícios se traz para a governança pública, pois quando as diretrizes estratégicas são bem desenhadas, há uma efetividade de todo o ciclo PDCA[7] [planejar (plan), fazer (do), checar (check) e agir (act)].
Angelina Leonez é Pós-graduada em Gestão Pública e Graduada em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Servidora da carreira de C&T do Ministério da Ciência Tecnologia e Inovações – MCTI, atuando na Coordenação de Recursos Logísticos como Pregoeira e Chefe da Divisão de Contratações Públicas.
5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Ministério da Economia. Secretaria de Gestão. Instrução Normativa nº 01 de janeiro de 2019. Dispõe sobre Plano Anual de Contratações de bens, serviços, obras e soluções de tecnologia da informação e comunicações no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional e sobre o Sistema de Planejamento e Gerenciamento de Contratações. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2019.
LEONEZ, Angelina Souza. Uma Evolução do Planejamento das Contratações. Revista Governet, ISSN 1809-6646, Curitiba, ano 16, n. 177, janeiro 2020. Disponível em: www.governet.com.br, Revistas On-line.
LEONEZ, Angelina Souza. Etapas do Plano Anual de Contratações – PAC. Disponível em: http://www.licitacaoecontrato.com.br/artigo/etapas-plano-anual-contratacoes-pac07022020.html. Acesso em fev/2020.
LEONEZ, Angelins Souza. Aspectos Relevantes Sobre a Aplicabilidade do PAC nas Rotinas Administrativas dos Órgãos Públicos. Disponível em: https://sollicita.com.br. Acesso em fev/2020
NOTAS
[1] Registro SEGES/ME
[2] Catálogos de material e serviço do Sistema Integrado de Administração e Serviços Gerais – SIASG, são as bases de dados que identificam todos os materiais licitados e adquiridos e todos os serviços licitados contratados pela Administração Pública Federal. (www.gov.br/compras)
[3] Portaria n° 448, de 13 de setembro de 2002, da Secretaria do Tesouro Nacional, do então Ministério da Fazenda
[4] Todo recurso público possui uma classificação contábil, que é definida pela Secretaria do Tesouro Nacional, vinculada ao Ministério da Economia. De acordo com o Tesouro, há dois tipos de despesas: custeio e capital.
Portaria nº 249, de 13 de junho de 2012
[5] http://paineldecompras.economia.gov.br/
[6] Unidade Administrativa de Serviços Gerais (UASG) – Portaria normativa do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – MP n.º 04, de 19 de dezembro de 2002.
[7] O Ciclo PDCA — também chamado de Ciclo de Deming ou Ciclo de Shewhart — é uma ferramenta de gestão que tem como objetivo promover a melhoria contínua dos processos por meio de um circuito de quatro ações: planejar (plan), fazer (do), checar (check) e agir (act).