Vigência da Nova Lei de Licitações
- 4 de fevereiro de 2021
- Posted by: Inove
- Category: Conteúdos
Em 10 de dezembro de 2020, o Plenário do Senado Federal aprovou o Projeto de Lei nº 4.253/2020, que estabelece o novo marco legal de licitações e contratos. Importante esclarecer que o texto definitivo do projeto encontra-se pendente de consolidação, para somente depois ser encaminhado para sanção presidencial.
O advento da nova Lei de Licitações tem despertado muitos questionamentos – naturais, diga-se de passagem – em torno de suas regras. Desse modo, decidimos elaborar um conjunto de publicações, com intuito de identificar suas principais características e inovações, de forma direta e objetiva.
Neste primeiro ensaio, destaca-se que a vigência da nova Lei de Licitações terá início tão logo ocorra sua publicação, conforme disposto em seu art. 191.[1]
Portanto, o período de vacância, previsto como regra geral na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro[2] , não acontecerá no novo marco regulatório, mas isso não significa que será uma corrida desenfreada contra o tempo para imediata adaptação.
Tal qual ocorreu com a Lei nº 13.303/2016, também chamada de Lei das Estatais, o Legislador previu que, ao longo do período de dois anos, serão mantidas as normas revogadas pela nova Lei de Licitações, quais sejam:
a) Lei n° 8.666/1993 (a agora ‘antiga Lei de Licitações’);
b) Lei n° 10.520/2002 (Lei do Pregão); e
c) Dispositivos da Lei n° 12.462/2012 (Lei do RDC).
Mas o que isso significa afinal? O legislador conferiu à Administração esse poder de escolha. Ou seja, caberá ao gestor público a definição de qual regime prefere ao longo desse prazo de dois anos a partir da publicação da nova Lei de Licitações.
Vejamos o que diz o PL nº 4.253/2020:
“Art. 191 […] §2º Até o decurso do prazo de que trata o inciso II do caput do art. 190, a Administração poderá optar por licitar de acordo com esta Lei ou de acordo com as leis citadas no referido inciso, e a opção escolhida deverá ser indicada expressamente no edital, vedada a aplicação combinada desta Lei com as citadas no referido inciso. (sem destaque no original).”
De forma breve e resumida, o que poderemos então ter a partir da publicação dos editais em determinado órgão da Administração Pública, durante o período de dois anos?
(i) Aplicação das regras antigas;
(ii) Aplicação já das novas regras;
(iii) A escolha deve estar expressa no edital de licitação;
(iv) É proibida da utilização das normas previstas no PL nº 4.253/2020, em conjunto com a legislação já existente.
Premissa básica para qualquer uma das possibilidades: é tempo de preparação, planejamento e capacitação. Independentemente dessa convivência de regimes prevista pelo legislador, é essencial que os operadores – sejam estes advogados, gestores públicos ou empresários – tomem as rédeas deste novo conhecimento a partir do marco regulatório inédito.
Por fim, algumas breves consequências dessa transição legislativa devem ser destacadas.
Como ficam os Contratos?
Não há qualquer dúvida. O Contrato Administrativo deve seguir o mesmo arcabouço legal definido no edital de licitação. O regime da sua licitação. Assim, se a construção do processo licitatório tiver se pautado pelas leis vigentes na atualidade (Leis nº 8.666/1993, 10.520/2006 e 12.462/2012), tais normas definirão a relação contratual entre as partes.
De outro lado, ao se optar pela nova Lei de Licitações, o contrato deverá respeitar este marco regulatório, em todos seus aspectos, como o período de vigência, prorrogações e critérios de revisão dos valores pactuados, para citarmos alguns.
Nessa linha, uma vez definidas, pela Administração Pública, as normas que servirão de base para um determinado processo licitatório, essas devem mantidas até o encerramento do contrato.
Imaginemos, para melhor entendimento, um contrato celebrado após a publicação da nova Lei de Licitações, mas que estabeleceu como premissa normativa a Lei nº 8.666/1993, valendo-se assim da regra contida no art. 191 do projeto de lei.
Tal contrato será regido pelas regras previstas na Lei nº 8.666/93, mesmo que sua vigência extrapole o período de dois anos, a contar da publicação da nova Lei de Licitações.
Por conseguinte, se a publicação do edital ocorrer até o prazo limite de dois anos, a contar da publicação da nova Lei, e a Administração optar pela utilização da Lei nº 8.666/93, este será o instrumento normativo imposto às partes até o final da vigência contratual, mesmo que essa vigência perdure pelo prazo máximo permitido pela atual Lei de Licitações, via de regra cinco anos.
De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Contas da União, ao analisar situação semelhante em relação à Lei nº 13.303/2016, tem-se a data de publicação do edital como marco temporal limite, para que a Administração possa fazer a escolha entre a legislação vigente e a nova Lei de Licitações.
Desse modo, se a publicação foi feita dentro do período de dois anos, a escolha da norma fica a critério da Administração Pública. Após esse período, somente será cabível a nova Lei de Licitações, como se observa a seguir:
“18. Entendo não haver dúvida em relação ao momento a ser considerado como de início do procedimento, isso porque não se pode ampliar a interpretação de concessão dada pelo legislador para uma transição de normativos. Com isso, a melhor interpretação é a de que a transição vale para licitações que tiveram seu edital “publicado” entre a edição do regulamento interno referido no §1º ou até o dia 30 de junho de 2018, o que ocorrer primeiro.
19. E os motivos para essa interpretação são simples. Em primeiro lugar, não seria razoável supor que o legislador fornecesse tempo indeterminado para a utilização da lei antiga, pois, caso prevalecesse a tese encampada pela equipe técnica do Metrô, qualquer objeto que tivesse seus estudos iniciados anteriormente à data de publicação da Lei 13.303, 1º/7/2016, poderia ser licitado por uma empresa estatal com base na Lei 8.666/93, mesmo que decorrido um prazo elevado. Seria ampliar em demasia uma flexibilidade pensada pelo legislador para harmonizar a transição dos comandos de uma lei nova.
20. Em segundo, o prazo de dois anos definido para a mencionada transição foi suficiente para que todos os procedimentos de adaptação tivessem sido incorporados pelas estatais, seja em relação à definição de seus regulamentos internos, seja no tocante aos ajustes dos estudos desenvolvidos na fase interna. Não seria razoável a alegação de que houve surpresa para a equipe técnica por comandos exigidos em uma nova lei ou de que haveria custos de ajustes para um suposto “inédito” normativo, decorridos 24 meses de sua publicação.
21. Em terceiro, é da data de publicação do edital que as empresas concorrentes têm ciência do objeto a ser licitado e, automaticamente, começam a investir recursos na preparação de suas propostas. A preservação dos comandos contidos em lei anterior visou manter o equilíbrio econômico nos contratos firmados pela Administração com particulares no interregno transitório. Passado esse período, natural que as empresas submetidas à nova lei já tivessem adaptado todos os seus procedimentos. (sem destaque no original). ACÓRDÃO Nº 2279/2019 – TCU – Plenário.”
Feitas essas breves considerações, como dito anteriormente, o importante é aproveitar o período de convivência legislativa para melhor adaptação e, sobretudo, capacitação e aprofundamento das novas regras pelos operadores da tão esperada nova Lei de Licitações.
Roberto Liporace é advogado graduado pela Universidade de Brasília – Unb. Atuação em Direito Administrativo com foco em Licitações e Contratos Administrativos. Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP.
Raphael Augusto Pinheiro Anunciação é advogado graduado pela Universidade de Brasília (UnB). Mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP. Advogado Especialista em Licitações e Contratos Públicos. Professor da Escola Superior da Advocacia (ESA), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF). Ministrou mais de 150 cursos para a capacitação de aproximadamente de 2500 profissionais nas áreas de Licitações e Contratos Administrativos, Lei nº 9.784/99, Instrução Normativa 02, Instrução Normativa 04, Gestão de Convênios, Prestação de Contas no Serviço Público, Elaboração de Termo de Referência e Projeto Básico, Tomada de Contas Especial, Formação de Planilha de Custos, Gestão e Fiscalização de Contratos Administrativos para setores públicos e privados.
[1] “Art. 191. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”
[2] “Art. 1 º Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada.”