Sistema S e convênios: Cautelas essenciais para instrumentos de cooperação
- 17 de dezembro de 2021
- Posted by: Inove
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A ausência de previsão normativa sobre convênios em seus Regulamentos de Licitações e Contratos deu ensejo a que as entidades do Sistema S normatizassem o tema por meio de regulamentos específicos, adotando, cada qual, uma terminologia e um regramento que melhor atendam às finalidades da entidade ao celebrar tais instrumentos de cooperação.
Neste sentido, são exemplos de entidades que disciplinaram em regramento próprio seus convênios, a Apex Brasil[1], o Senar[2], o Sescoop[3] e o Sebrae[4]. Apesar das especificidades de cada regulamento, observa-se como características comuns o fato de que os convênios se destinem a cumprir objetivos comuns aos partícipes. Demais disso, via de regra, estão previstas a possibilidade de cooperações com e sem repasse de recursos financeiros e a possibilidade de celebração com entidades públicas ou privadas.
Considerando a iteratividade da celebração de convênios no âmbito das entidades do Sistema S envolvendo, por vezes, recursos financeiros oriundos destas entidades, o assunto tem merecido atenção dos órgãos que exercem controle sobre tais entidades. Percebe-se, de forma mais recorrente, uma atuação pedagógica resultando em relevantes orientações para as entidades do Sistema S melhor gerirem seus instrumentos de cooperação.
Neste contexto, destina-se o presente artigo a elencar boas práticas recomendadas para as entidades do Sistema S no que tange à celebração e gestão de seus convênios, extraídas majoritariamente de entendimentos já externados pelos órgãos de controle. Passemos a elas:
1. Objetivo
De acordo com entendimento adotado pela jurisprudência do TCU, os convênios devem contemplar objetivos comuns, em regime de mútua cooperação entre os partícipes. Neste sentido, cita-se o seguinte precedente:
Acórdão de relação 3.749/2007
1.1.8. limite o uso do instrumento de convênio aos casos em que efetivamente houver interesse recíproco e regime de mútua cooperação, abstendo-se, nos casos de simples prestação onerosa de serviços, de firmar convênios, devendo proceder à contratação, mediante o devido processo licitatório, nos termos do Regulamento de Licitação e Contratos da entidade;
Conforme se extrai da decisão, os convênios devem versar sobre situação diversa da verificada nos contratos, orientação que se destina a evitar que por meio da celebração de instrumentos denominados convênios, a entidade celebre verdadeiros contratos sem, contudo, observar seus respectivos regulamentos sobre licitações e contratos, eximindo-se também, indevidamente, de atender aos entendimentos dos órgãos de controle.
2. Pertinência temática
Outra orientação recorrente é de que os convênios das entidades do Sistema S tenham objeto compatível com as finalidades da entidade. Neste sentido, entendimento da CGU:
“Ao firmarem convênios, acordos, ajustes ou outros instrumentos congêneres, as entidades do Sistema “S” devem definir objetos que guardem correlação com suas funções regimentais de forma a evitar o desvio de finalidade. Além disso, os normativos internos ao disciplinarem a celebração de convênios, acordos e/ou ajustes devem seguir como referencial as normas vigentes na Administração Pública Federal, quanto ao detalhamento do objeto, do plano de trabalho, dos percentuais de participação, a abertura de conta específica e a prestação de contas, dentre outros assuntos.” (Entendimentos do Controle Interno Federal sobre a gestão dos recursos das Entidades do Sistema “S”. Perguntas e respostas. Brasília, 2013, p. 13).
E, na mesma linha, tem se posicionado a jurisprudência do TCU:
Acórdão 1924/2021-Plenário
É irregular a celebração de convênio por entidade do Sistema S para consecução de objeto que não possua nexo direto com a sua finalidade institucional.
O entendimento é consentâneo com outros do próprio Tribunal que evidenciam que o foco de seu controle sobre as entidades do Sistema S é assegurar que os recursos de tais entidades sejam devidamente empregados em suas finalidades, uma vez que esta é a motivação que subjaz às contribuições parafiscais das quais se originam estes recursos.
3. Rateio dos encargos assumidos
Considerando tratar-se de ajustes para consecução de objetivos comuns, em regime de mútua cooperação, deve ser observado equilíbrio entre os encargos assumidos pelos partícipes, evitada a onerosidade desproporcional em relação a um deles. Neste sentido, manifestou-se a CGU:
“O que deve ser observado na celebração de convênios, acordos, e/ou ajustes entre as entidades do Sistema “S” e as Federações?
Os objetivos previstos nesses instrumentos devem ser comuns às partes envolvidas e não privilegiar os interesses de um partícipe em detrimento dos interesses dos demais. Nesse sentido, o rateio dos custos de convênios e acordos, deve respeitar o critério da proporcionalidade entre os dispêndios e os benefícios de cada entidade. Devem ser avaliados, também, os objetos dos instrumentos e os possíveis resultados a serem atingidos, de forma a apresentar elementos que atendam aos objetivos da entidade.” (Controladoria Geral da União, Entendimentos do Controle Interno Federal sobre a Gestão dos Recursos das Entidades do Sistema “S”, 2009, p. 32).
Tal orientação é coerente com a descrita no item 1, referente à necessidade de distinguir convênios de contratos com vistas a evitar o uso daqueles para burlar o cumprimento de normas aplicáveis a estes.
4. Demonstração de cumprimento do objeto por meio de prestação de contas compatível com o objeto da cooperação
A apresentação de prestação de contas relaciona-se diretamente à governança, sendo inclusive um de seus princípios (accountability). Refere-se à comprovação do cumprimento dos objetivos propostos. No caso de transferência de recursos financeiros, essa necessidade se acentua e sua ausência pode acarretar o dever de ressarcimento à entidade pelo beneficiário do recurso não aplicado.
A propósito da necessidade de prestação de contas dos convênios, destacam-se os seguintes precedentes do TCU sobre o tema:
Acórdão 10119/2017-Segunda Câmara
As entidades integrantes do Sistema S estão obrigadas a exigir prestação de contas daqueles que com elas pactuem convênios, uma vez que gerem recursos públicos e estão, portanto, sujeitas aos princípios gerais aplicáveis à Administração Pública, assim como ao disposto no art. 70, parágrafo único, da Constituição Federal.
Acórdão 3224/2014-Plenário
As entidades integrantes do Sistema S devem observância aos princípios que regem a Administração Pública e aos regulamentos próprios quando da celebração de convênios ou instrumentos congêneres, sendo obrigatória a devida prestação de contas por parte dos beneficiários dos recursos transferidos voluntariamente por aquelas entidades.
5. Normatização dos procedimentos
Outra recomendação dos órgãos de controle, refere-se à necessidade de que os procedimentos referentes aos convênios sejam objeto de regulamento próprio, seguindo diretrizes da Administração Pública. Neste sentido, destaca-se a seguinte orientação:
“Quanto à normatização de convênios, acordos e/ou ajustes celebrados entre as entidades do Sistema “S” e as Federações ou outros entes, é necessário observar a linha orientativa e as normas vigentes na Administração Pública Federal que regulamentam o objeto, o plano de trabalho, os percentuais de participação, a abertura de conta específica e a prestação de contas, entre outros assuntos.” (Controladoria Geral da União. Entendimentos do Controle Interno Federal sobre a Gestão dos Recursos das Entidades do Sistema “S”, 2009, p. 32)
Cotejando esta recomendação com as demais aqui abordadas, bem como visando alinhamento às melhores práticas de governança, podem ser elencados os seguintes temas a serem tratados no normativo interno:
- requisitos para celebração do instrumento de cooperação (plano de trabalho, projeto, proposta ou documento similar),
- espécies de cooperação (técnica, técnica e financeira);
- cláusulas obrigatórias do instrumento (vigência, objeto, obrigações dos partícipes, prazo e modo para prestação de contas, etc);
- hipóteses de rescisão do instrumento de cooperação;
- modo de apresentação de prestação de contas.
Postas estas considerações, verifica-se que no que se refere ao tema convênios, o controle sobre as entidades do Sistema S destina-se prioritariamente a assegurar a aplicação dos recursos postos à disposição de tais entidades.
Para tanto, os órgãos de controle têm emitido diversos posicionamentos, aqui sintetizados, os quais aplicados têm o condão de assegurar que os recursos de tais entidades sejam efetivamente aplicados às suas finalidades institucionais, de forma transparente e responsável, em compatibilidade com a missão para a qual foram criadas.
Gabriela Lira Borges é Mestre em Governança e Planejamento Público pela UTFPR. Especialista em Direito Constitucional pela Unisul. Especialista em Direito Tributário pela Uniderp/Anhanguera. Procuradora do Estado do Acre de 2005 a 2012. Consultora Jurídica da Consultoria Zênite de 2012 a 2016. Analista de Licitações do SESC Paraná de 2016 a 2017. Atualmente, Assessora Jurídica do SENAR Paraná. Autora de diversos artigos jurídicos, versando especialmente sobre licitações e contratos, regime de pessoal dos servidores públicos e Sistema S e consultora jurídica na área de licitações, contratos e regime jurídico de servidores públicos. Site: https://www.gabrielaliraborges.com/. LinkedIn: Gabriela Borges.
[1] Disponível em <http://www.apexbrasil.com.br/uploads/Regulamento%20de%20Conv%C3%AAnios%20Apex%20Brasil.pdf>. Acesso em 04.12.2021.
[2] Disponível em <https://www.cnabrasil.org.br/assets/arquivos/REGULAMENTO-DOS-PROCEDIMENTOS-PARA-CELEBRAC%CC%A7A%CC%83O-DE-TERMOS-DE-COOPERAC%CC%A7A%CC%83O.pdf>. Acesso em 04.12.2021.
[3] Disponível em <http://www.sescoopsp.org.br/sms/files/file/conveniosepatrocinios.pdf>. Acesso em 04.12.2021.
[4] Disponível em <https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/Anexos/Anexo-V_IN-41_Projetos-Parcerias-e-Convenios.pdf>. Acesso em 04.12.2021.